segunda-feira, 30 de abril de 2012

O valor da fantasia



Eu quero acordar
E ver sumir o teto,
E ao por os pés no chão
Sentir ele de grama repleto
E respirar cheiro de dama da noite
Com os raios de luz no meu lençol
Ver o rosto dos meus filhos
No lugar do sol
Escolher que idade terão nesse dia
E conseguir ser integralmente bacana
Bagunçar tudo e com eles brincar de cabana
E poder voltar nesse momento
Eternamente 1 vez por semana
Eternizar
Muitos tubos de tinta
Espalhados pelo meu lar
Na sala castelos de areia
Que nunca vão desmanchar
Uma mesa cheia de moedas de ouro
Que eu nunca gastaria
Pois nada compra, destrói ou corrompe
O valor da minha fantasia

Baby Boomers



Engraçado é que esse era o principal bordão do meu pai: -Erika! Faça o que eu digo, não faça o que eu faço! Com o passar dos anos compreendi essa frase como o símbolo principal do falso-moralismo. O fato é que creio que a anti-educação dele deu certo...Certo? Sim, aprendi a não dormir em travesseiro de pedra.
Apesar das perdas, apesar de já ter compreendido que os louros não chegam em moedas de prata... aprendi que a vida não é um escambo. Que não devemos “ser bons” objetivando recompensa, objetivando nada. Aliás, sequer devemos ter a pretensão de que dominamos os conceitos de “certo e errado”, se esse conceito existisse, não seria nos dado o livre arbítrio que nos dá acesso na verdade a mais de dois caminhos.
Quando meu pai estava para morrer eu ficava de mãos dadas com ele o tempo todo, e tentava falar de Jesus. Um momento ele chorou muito e com raiva disse que não merecia o que estava passando, eu respondi que vários morreram "sendo penalizados" e sem ter culpas, então pedi que ele parasse de buscar um motivo para a dor... ele me disse que a dor dele era a maior de todas. Eu não consegui acalmá-lo, mas ele me fez  jamais pensar em Jesus, ou quaisquer religião apartir desse momento, e passar a pensar apenas nos homens e suas mazelas.
Ele era gerente de treinamento do Serpro, foi ele quem implantou a gerência de recursos humanos nessa entidade e eu nem tinha noção disso, quando um colega dele me disse que o projeto que ele implantou modificou e fez crescer essa instituição, mais ou menos o que o Lula fez na indústria metalúrgica e se tornou presidente, meu pai fez, ninguém nunca ouviu falar dele, e morreu em péssimas condições, como muitos que se foram nesse país, muitos amigos dele... os tais da geração Baby Boomers...muitos morreram como mastodontes sem presas, pois aprenderam a sentar e comer, mas não aprenderam a caçar. Na época em que “desemprego” soava tão mal quanto “câncer”.
Eu ficava sentada na mesa, vendo ele desenhar as transparências, com pirâmides de Maslow e livros de Peter Drucker espalhados na mesa. Meu professor. Mortes sem objetivo? Kamikazes involuntários para uma sociedade onde seus filhos não ficariam mais sentados sobre a estabilidade. A estabilidade que debilitava os cérebros e a liberdade de pensar. A falsa segurança, talvez até a falta de fé.
Os pobres não são lembrados e jazem como adubo sob os nossos pés.  

Eu não reciclo



Sim, é verdade: Eu não reciclo meu lixo!
“A paz mundial” e “reciclo meu lixo” são atitudes que as misses conseguiram disseminar para o resto da humanidade. Perguntem a 100 pessoas, de que forma elas contribuem para o planeta e 70% responderá: reciclo meu lixo!
O mais curioso, é que dessas 100 pessoas, as 70 que reciclam, são as que mais CONSOMEM. Perguntemos a elas, se cogitam DIMINUIR O CONSUMO DE SEU LIXO.
Reciclemos nossas idéias: De onde vem tanto lixo? Refutemos a idéia de passar a viver sem ele. Educação. (Do tipo daquela que faz parar até um indigente joga um papel de bala no chão, não, ele sequer consome). Digo educação dos valores de consumo. O que fazer se nossos heróis modernos são as marcas?
Pois o lixo já foi casca, já foi pedra, metal...papel, discos de vinil, até palavras já foram lixo: sobravam...o que sobra hoje? Sobra matéria. Matéria plástica, matéria tóxica...matéria, matéria, matéria....Mãe!!! Você cogita ensinar ao seu filho valores humanos, doação, fraternidade, divisão? Isso é muito difícil não é mesmo? Mais fácil comprarmos as lixeirinhas (de plástico), cada uma de uma cor para salvar a humanidade.



Gente Singular



Não sei se dói, ou se apenas estranho o fato de não sentir mais alegria ou prazeres no que era habitual para mim.
Crescer, no sentido apresentado como social, não me interessa, e se, por um tempo fingi me preocupar com cotidianos, talvez para manter minha sanidade mascarada com roupas sociais aceitáveis, hoje, atingi o que considero meu ápice: “cago e ando”. Não há alegria nisso...essa sou eu, por debaixo de tudo que me fizeram aprender ou ser.
Eu pari minha filha, e só assim entendi que mais amplo do que a normalidade, é a singularidade. E só há dois caminhos para a singularidade: a escolha ou a fatalidade.
É como um prazer dolorido, são quase sádicas as visões que passei a vislumbrar depois que arranquei meus olhos, e por baixo destes, novas órbitas me mostram outros significados de coisas que eu achava banais ou muito importantes. Tudo material passou a ser feixe, ilusão, impressão, etéreo...e os sentimentos, as dores, as saudades, os amores, passei a perceber como o que há de concreto,
Sim, essa inversão já teve em mim o peso de uma deficiência.
A transcrição dos meus sintomas talvez configurassem caso de internação para alguns “doutores”, que hoje entendo...aprenderam a ser um imenso cordão de isolamento, o front da guerra contra as diferenças, portando dicionários e compêndios para classificar as aberrações humanas, cuja sociedade precisa ser poupada do convívio.
Aquelas pessoas...que tem vontades, desejos, dificuldades ou costumes que não estão transcritos nos parâmetros da normalidade, por isso vão ser incluídos em listas de síndromes de nomes estranhos, sejam essas síndromes já descobertas e comprovadas em hélices de dnas defeituosos, ou síndromes que, ainda inexplicáveis ou incomprovadas.
Gavetas mais fáceis de armazenar nossas mazelas, essa qualificação também facilita a escolha do remédio a ser indicado, ajuda também, que nós mães, nos conformemos com o laudo que PROVA que nosso filho não passará de um autômato, afinal de contas, nós também sempre fomos...assim como nossos filhos que não necessitaram ser enquadrados, não enxergam que o limite da indiferença está um passo antes da linha da tolerância, sequer sabemos o que há do outro lado, mas com certeza, é um mundo melhor.

O menino e o pânico



Um menino tomou um tombo em um terreno, onde vários outros brincavam de estilingue, durante a noite, brincando de acertar as estrelas, ele se machucou um pouco, e assim que levantou, um dos meninos perguntou: Você quer brincar de estilingue? Ele disse: Não! Eu tenho que ir para minha casa...foi embora.
No dia seguinte ele passou pelo mesmo lugar, tomou outro tombo e desta vez quebrou a perna. O outro menino, não tendo percebido que ele quebrou a perna, repetiu: Você quer brincar de estilingue? Ele disse: Não, dessa vez me machuquei muito! E eu não me lembro por que, mas eu tenho que ir para minha casa, eu nem sei o que estou fazendo aqui... e foi novamente embora.
No terceiro dia, ele insistiu e passar pelo mesmo lugar, insistiu em ir mesmo com a perna engessada. “–Cada vez em que eu passo nesse terreno eu me sinto pior, mas ele é caminho para a minha casa.” Tomou outro tombo, vieram todos ajudar por que foi mais grave, nem tinha como o outro menino perguntar se ele queria brincar, mas ele ajudou a levá-lo para casa.
No quarto dia, o teimoso insistiu em voltar no mesmo lugar, com auxílio de uma muleta, e sua muleta quebrou...ele não queria nem mais se levantar, mas o outro menino falou: Espera que eu vou consertar a sua muleta! Ele consertou e assim foi o menino da muleta para casa.
Ele tirou o gesso, e continuou precisando da muleta, mas todos os dias seguintes ele insistiu em ir ao mesmo campo, com a muleta, quando outro menino perguntou: Será que você precisa de muleta? O menino disse: Preciso, eu já tomei muitos tombos ao passar por esse terreno! Mas seu novo amigo, também teimoso, tomou a muleta de suas mãos e ele balançou mas não caiu! E devagar conseguiu andar!
Passou pelo terreno mais um dia andando, e o menino o chamou para brincar, e ele respondeu: Dessa vez eu vou!
Deram o estilingue e o fizeram olhar para o céu. Ele armou o estilingue, puxou o elástico, e na hora em que ele olhou para o céu, ao invés de ver estrelas, viu vários meninos de asas.
Não atirou, por que ele lembrou que ali naquele terreno ele começou a andar, e começou a andar por que a muleta quebrou, e ele usou a muleta por causa da perna quebrada, por que quebrou a perna após ter caído dos céus ao ser atingido por uma pedra, e que antes desse tombo , ele sabia voar.


Vovó



Um pequeno ser faz aflorar essa magia, o perceber o mundo de outra forma, olhar para o nascimento com delicadeza, olhar recém-nascido não como “um grande compromisso” da maternidade, mas com a simplicidade e fragilidade da vida.
Os filhos já foram criados, e lamentamos por todos os momentos que já se foram com eles, e os momentos que, na pressa do viver, deixamos esvair entre nossos dedos.
A avó não conta os dias para ele andar, falar, entrar para a escola... ao contrário, torce para o tempo andar devagar, nesta torcida, percebemos que ele, o tempo, não é tão imperdoável, e nos trás a oportunidade de simplesmente contemplar. Isso, contemplar... é isso que o neto nos ensina: que mesmo quando éramos apenas mães, deveríamos ter aprendido a contemplar a vida como um broto de planta.
Nesta contemplação, que hoje compreendo ter também ter recebido de minha avó, o amor e o bom exemplo nascem como poesia impensada, como os versos não calculados dos melhores poetas, esses versos recebi dos meus avós e só agora eu os entendo. Dentro desses versos, toda dor e qualquer matéria perdem os por quês...Por que perder tempo? Pra que? O abismo que surge ao se deparar com essa realidade, é oprimido por mãozinhas e pezinhos minúsculos, que você não pensa como vão ser quando crescer.
Não dá para explicar a “voternidade”, vou tentar...aprender a olhar descartando as paredes, nada ver e apenas sentir, proteger, é o início do verdadeiro crescimento ou quem sabe sua constatação, a flor que você gerou e virou fruto, exercício para ser anjo.

Saudades do meu pai




Os pais escolhem e decidem ter filhos, a gestação, o parto...a criação são compromissos primordiais de quem teve essa escolha...o filho não tem o que escolher: Na ordem natural das coisas, você tem que conduzir à partida, daquele que te permitiu a chegada, é uma espécie de parto, na nossa ilusão, muito mais doloroso. E nessa “condução”, necessitei de um tipo de atendimento médico para meu pai , do tipo que se espera que seja  “Imbuido de razões humanas e sensibilidade”. Será?

Vou dar uma sugestão para o Ministério de Saúde aplicar nos Hospitais Públicos: Procurem a competência na ilicitude.

Não quero ouvir respostas do tipo: É o estado...a verba não é repassada...o salário é pequeno...que eu grito...FALTA HUMANIDADE, falta competência e acima de tudo falta respeito pela dignidade humana. Falta amor ao trabalho, falta missão...falta...

Peço aos pobres senhores diretores de hospital que percam o medo dos doentes terminais e o gráfico negativo que eles possam gerar no balanço de seu cargo. Peço aos mesmos diretores de clínicas que parem de mentir ao dizer que não realizam determinado procedimento, que na verdade realizam...mas não é para os seus pais.

Peço a todos que aceitaram cargo em hospital ou passaram em concurso público que compreendam que doença e burocracia não combinam, e que sempre temos a opção de tentar melhorar o ambiente ou abandoná-lo. Não percam suas vidas fazendo parte de um sistema desumano...tentem mudá-lo.

Não haviam quadros do Van Gogh na sala de hipodermia onde os pacientes ficavam abandonados, mas seriam apropriados talvez “o Corvo”, um Munch cairia bem com “O grito”...mas não tem nada para ilustrar além de olhos amarelos, cheiro  sangue no chão (o chão me lembra Pollock) misturado com o cheiro de urina. A dor estampada em diversos rostos que não imaginam que não estão amparados. Cena de guerra...mulheres e homens no mesmo ambiente com sua intimidade exposta (isso chega a ser o de menos mas aí teremos Schielles, só pintores malditos).

Me lembrei muito da brincadeira do telefone sem fio! Uma equipe que chega, que não sabe onde a outra parou, que não sabe o que a outra fez...e se acham todos vítimas do governo. Pessoas boas, algumas pérolas, que imagino o quanto sofrem ao tentar trabalhar corretamente, pessoas que sabem o que é ética e missão.

Triste constatar o tipo de persuasão que necessitamos as vezes chegar...por vezes usei de jogo de cintura, de palavra mansa ou de palavras difíceis...outras de palavras ameaçadoras, estas as mais competentes. Feliz em saber que podemos requisitar força policial para persuadir ao atendimento.

Imagino as milhares de pessoas sem estudo nas mãos desse sistema, sem  conhecer argumentos para “reclamar”, aceitando a cansativa explicação: “É o governo”....

Mesmo assim tudo é vago...Podemos confiar nas equipes que conduzem esse último parto? Pois se para todos os procedimentos somos ignorantes, pra que explicação...bastaria credibilidade. Eu não encontrei essa tal credibilidade durante essa condução...Não me venham dizer para ter fé... eu tenho, mas gostaria de ter no homem, a fé que talvez eu não tenha mais em mim mesma. Estamos nas mãos da incredulidade, e do silêncio que o quanto eu puder eu vou romper mesmo não sendo digna para isso.

É...a vida continua, e a morte a desmistifica, a simplifica e a torna banal.

Só perdendo alguém nos damos por conta, finalmente de  que tudo é passageiro, pouco é nosso e quase tudo emprestado. Como e pra que continuar essa jornada? Sorrindo? Sorrir na certeza de que aqui somos clandestinos é muito difícil, mas vale o esforço sorrir para ajudar aos que estão no início de uma caminhada, e na certeza de que solidão é apenas saudade que um dia vai ser esgotada.

Talvez eu tivesse acreditado até hoje que a fé me traria um 0800 espiritual  de consolo...onde com uma linha direta, eu teria notícias daquele que sempre quis saber a hora que eu sairia ou iria chegar. É as notícias não chegam mesmo, e eu me sinto talvez como ele se sentia nas noites em que eu saia sem dar notícias e ele ficava me esperando na porta. Eu acredito que ele está em algum lugar, mas não sei como, isso é desconfortante, além da saudade.

A fila anda...é isso também que a perda te mostra...continua caminhando e de cabeça erguida...faz algo que ele tenha feito, e coisas que ele deixou de fazer...tenha tempo para seus filhos...ame...seja carinhoso...diga hoje o que sente...trabalhe muito sem deixar de relaxar...

Apesar da perda, acredito que em algum lugar ele e outros laços que cultivei, que consegui amar apesar de desavenças, que consegui perdoar e ser perdoada, que não se mantiveram por valores superficiais...estão aqui e lá, perenes, na verdade, a única força perene da natureza, e é por ela que devemos continuar sorrindo.

Carta ao tempo




Ele, o destemido e implacável tempo, na sua tarefa árdua de descascar as paredes, matar os ideais, envelhecer as pessoas...não consegue abortar meus sonhos...

A angústia causada pela incerteza do futuro, misturada com a ansiedade de conquistar minhas paixões, me fazem perder o sono...

Sinto que cresço e que estagno concomitantemente, quando constato diariamente que muito quero, e pouco posso, muito almejo e pouco tenho. Muito posso ser e quase nada estou...

Devaneio a respeito de como comunicar meus projetos para aqueles que esperam de mim o praxe, a cortesia ou até mesmo a formalidade que em mim inexistem.

O que fazer, se o que melhor produzo são sonhos, se cresço no lúdico ou nas incoerências do mercado?

Brinco que vou comunicar minhas idéias em prosa, e que vou ter como resposta choros ou risos, broncas ou aplausos...

Digo-lhes com veemência que todos os seus atos são vãos, pois  todos os meus direitos são divinos, e que meus deveres são obrigações éticas que tive a infância para aprender, assim como fazer a higiene pessoal ...

Vocês podem lavar minha alma além de assinar minha carteira?

Me ajudar a conquistar um cargo ou a lua? Pois se não pretendo simplesmente me aposentar, mas um dia cumprir a  minha missão...

Nunca vou esperar uma placa de condecoração por serviços prestados.

Quero conquistar um espaço, como uma árvore plantada:

Aqui vive, sobrevive dignamente, quem tanto amou a e lutou para viver apenas de sua vocação!

O pescador cego e a ostra



Eu nunca fui à lua, sei que estou perdendo, mas consigo viver sem ela por que nunca estive lá, se eu a conhecesse e viesse embora, sofreria de saudades. Eu poderia chegar à lua, e ficar decepcionada: Esperava que ela fosse melhor. Ou seja, nascer cego, pode ser menos doloroso do que adquirir a cegueira.
Como serão as fantasias daqueles que não enxergam? Tem cheiro? Sabor? Como imaginam as formas? Talvez existam sentidos, que nós desconhecemos, mas vivemos sem eles. Vivemos? Como se sentir atraído sem ver? O que é ver? O que vemos sem os olhos?
Bom, nosso pescador nasceu cego. Recebeu boa educação dos seus pais, tudo para a sua sobrevivência, aprendeu bem o ofício, e dele depende completamente. Às vezes não tem peixe, tem temporadas de chuva, mas ele aprendeu a salgar e conservar seu alimento.
Certa manhã, ele acordou, abriu os olhos e achou que era um sonho estranho, mas na verdade ele estava enxergando, tudo, tudo, tudo...Então ele correu para a praia, olhou para a areia, entendeu como é o azul do mar e do céu, tentou fitar o sol, recolheu flores coloridas, foi pescar e desta vez até mergulhou para ver o fundo do oceano, viu uma enorme ostra, que ele não sabia que era ostra, pegou peixes com as mãos e admirou o brilho das escamas, quis aproveitar a noite e conheceu uma linda mulher, e se apaixonou.
Foi dormir, sonhou com tudo que viu durante o dia. Acordou novamente na escuridão. Sentiu que perdeu o mar, a areia perdeu o sentido, das flores só restou o cheiro, entendeu que poderia ter ficado rico pegando as ostras e se casou com aquela mulher.
Tentou conservar o sonho, mas foi ficando turvo...as lembranças de como as coisas eram, foram perdidas, sobreviveu apenas o sentimento de perda. Sua mulher ele tocava quase todos os dias e sua voz parecia mais cansada, e sua pele menos lisa, os cabelos menos sedosos, os seios mais murchos...mas ele ia pescar todos os dias.
Mesmo sem enxergar, mergulhava todos os dias para encontrar a ostra. Ostra? Uma casca dura, que se abre um pouquinho todos os dias para se alimentar, dentro delas tem uma manta, o nácar , e a ferida nesta manta, causada mais comumente por um grão de areia, cria uma reação de defesa: A pérola. Quanto mais feridas tem uma ostra, mais ela cria pérolas.
Cada dia o pescador saia do mar com um crustáceo diferente, conchas diferentes, mas o informavam: Não é uma ostra.
Uma vez passou dias abraçado a uma concha, crendo ser uma ostra, quando levou ao comerciante, ele o informou: Não é uma ostra! Que decepção...
Em seu lar, dentro de um galão, foram se acumulando esses “enganos de ostras” de todos os tipos. Alguns ele colocou até para enfeitar a casa, crendo ser belo.
O pescador gastou muitos dias em seu ofício, os filhos cresceram bem alimentados, a mulher sempre ao seu lado porém só. Pois o tempo passou, e os cheiros do mar eram mais agradáveis que a rotina. O pior, a rotina no escuro, de poucos sentidos. Mas ele acreditava piamente que estava fazendo a parte dele, por que voltava pra casa com o peixe, e assim havia feito seu pai, ensinado pelo seu avô, que aprendeu com seu bisavô e assim por diante. Bastava cumprir sua missão e voltar para casa com o peixe, alimentar e vestir é ser bom pai, e ser bom marido é voltar para casa.
Depois de anos, tornou a ocorrer o mesmo milagre: acordou enxergando! Crente que perderia a visão no mesmo dia, refez todo o caminho da outra vez, não encontrou a ostra, mas ele foi dormir e acordou ainda enxergando...todos os dias.
As coisas não eram mais tão belas como ele lembrava, a mulher envelheceu, a casa também, os objetos, algumas coisas como o mar, o sol e o céu continuaram lindos, mas nada da ostra aparecer. Sempre os mesmos mergulhos, e nada... Revirou o galão na esperança dela lá estar.
Gastou sua energia na claridade, da mesma forma que gastou na cegueira...mas não encontrou. Talvez ela nunca tenha existido, ou quem sabe ele ainda não tinha total capacidade de enxergar. Mas ele procurou a vida inteira...por essa casca, cujas feridas viram uma jóia. Partiu pobre e sem entender que produziu pérolas a vida toda, com a mesma contribuição da areia ferindo o nácar de todos que o rodeavam, nenhuma luz foi capaz de abrandar sua escuridão.

Poder Feminino



Onças pintadas de rímel e baton, gazelas correndo desajeitadas de peep toe, sensualidades medidas por bolsas ricas penduradas, cabelos artificiais, poderosas mulheres homens...não aguento mais...
Mulheres, larguem de tanta besteira, seus corpos são belos, mas suas almas são caldeiras, efervescer de sentimentos e idéias, cuja ebulição aumenta com o passar dos anos.
Cozinhando a mim mesma sobre esse fogo, eu me encontrei, achei minha legitimidade. Traços que nascem quando nos distanciamos da eterna autoridade. Só assim, fiquei pronta para a minha jornada, um caminhar por uma longa floresta.
Aterrorizada por Pã, Fúrias, Medusas e outros demônios, encontrei no chão, uma pequena brecha. Chamei minha menina de 6 anos, que adorava brincar na terra, e eu sentada comigo mesma, temos cavado para encontrar outras de nós, as desconhecidas, mortas ou enterradas.
Não há outro caminho para as Evas...Não somos quem pensamos que somos, nos nossos maiores delírios de grandeza, tentamos conquistar terras que não nos pertencem: Terrenos de poder, adubados pelos Adões! Isso não corresponde a um hectare do latifúndio de nossos paraísos (aqueles aos quais fomos expulsas).
A que se temer seres que já foram oráculos, esposas de dragões, bruxas...incendiadas por brutos aldeões. A que se castrar quem já nasceu castrada. Escurecer sexo que nasceu iluminado, tirar a luz de quem dá a luz.
Quais os poderes das fêmeas do mundo animal...sentir o cheiro do inimigo, defender a ninhada dentro e fora do abrigo, acarinhar, ensinar...ninar. Luxo é vestir o corpo com a alma, e o seu cartão sem limites, nunca conseguirá a ela comprar.

Raça Covarde




Calamos-nos, enquanto o mal não atinge a nós mesmos. O nome disso é omissão, irmã de sangue da covardia.
Criaturinhas ensossas que somos, apenas entendemos o sentido da palavra empatia, quando sentimos o mal na própria pele.
Acabaram-se as listas de defeitos viáveis, para nos culparmos e nos agredirmos uns aos outros, portanto, não é mais necessário motivo para que expliquemos nossas próprias atrocidades, pois a verdade, é que o mal sempre existiu pelo próprio mal, não para atingir aquele que tem religião diferente, cor, raça, sexo, opção sexual...isso sempre foi uma justificativa para lançarmos para fora, o que existe dentro de nós. O “pai rancor”, marido da “esposa medo”.
De onde surgiu esse medo¿ Talvez do princípio de tudo, onde era o “diferente”, o mensageiro da pedra ou espada que nos colocaria, frente a frente com o desconhecido: a morte. Pois é, passamos a temer uns aos outros, tal qual a lebre, teme a raposa.
Talvez a cultura do “Inimigo”, nunca acabe. Alguém precisa ocupar a cadeira dos nossos desterros. E entram eras e saem eras, de danças da cadeira, tronos dos nossos próprios demônios são cultuados, materializados em criaturas inocentes...inocentes¿
Pergunto-me em que ponto termina a ignorância bruta e começa a inocência, que antecipa a mais completa crueldade humana. A inocência é um momento único, e talvez nela esteja a ciência da velocidade da luz. Nossa razão, habitando ainda corpos rudes, incapazes de capturar a inocência, de contemplar a beleza e as diferenças, se encontra no paradoxo que liga o homem ao animal de forma mais profunda possível. O animal esta próximo da natureza e de suas forças maiores, para perto de quais forças nos encaminhamos quando ganhamos a inteligência¿
Nos calamos, enquanto o mal não atinge a nós mesmos. O nome disso é omissão, irmã de sangue da covardia, mas isso é coisa de homem, não de bicho.





quarta-feira, 25 de abril de 2012

O Circo




Não há melhor analogia para a vida, do que a história do circo. Pois somos os leões enjaulados, macacos vestidos, palhaços desinibidos.  Truques mentirosos, que fingem ser magia, de ilusionistas completamente desiludidos.

E vai começar o espetáculo:  E olhem  para meu rosto pintado! Nele estão impressas dores, semelhantes à do filho de alguém da platéia, que sofre por não saber ser ator. 

No atirador de facas de olhos vendados, apresentamos as lástimas daqueles que se sentem cegos,  e angustiados habitantes de um mundo, que nada lhes restou, senão mirar alvos de idéias sem sentido...ou pessoas,  que representem tudo aquilo,  que não teve coragem de ser.

Entre no picadeiro e faça parte dos infortunados pensantes. Aqueles que acordam pela manhã, se indagando, por que estamos aqui, partamos para outro lugar...Nem a balarina, recebeu aquela educação brilhantemente motivadora, que nos repete a cada dia, que temos que aceitar a fórmula do sucesso.  Pois é... e as coisas que eu poderia capturar com as mãos, não fazem meus olhos brilhar. 

Certamente, meus insights estão longe de serem populares, são apenas flores particulares,  espetáculo mambembe ultrapassado, cujas raízes se estendem a terrenos que são só meus, fora do unânime. Eu sou as ideias rejeitadas, o exemplo a não ser seguido. O espelho do oprimido, a pintura do pintor louco, as palavras do verbo não proferido.

Sou invisível estando no meio da população...a palhaça que quando aprendeu a pensar, esqueceu o que é sorrir, pois carrego em minhas dores, as dores da multidão.  

terça-feira, 24 de abril de 2012

Triste confissão




Eu deveria, poderia e teria argumentos da minha IMAGINAÇÃO para começar uma história com recursos lúdicos, líricos, tons pastéis, rimas ricas...e, incrivelmente eu sei chegar nesse extremo como poucos, e vou chegar... Eu tenho um diploma costurado em minhas vísceras, e não me orgulho da ausência de cadeiras acadêmicas dele, mas cada um faz o que pode. A burocracia me enriqueceria...com certeza. Mas só ela não me bastaria. Frequentei dores, pânicos, empatias, soluções, medos e milagres que ninguém freqüentou.

...Em baixo do tapete florido e com arabescos, está o sangue, está ali por anos, mas está fresco, vivo, bem mais vivo que minhas lembranças enterradas. Não chega a ser um líquido jorrado por um assassinato, ou por uma tão grave mutilação. É o sangue que está simplesmente por baixo do tapete da minha dor. Sua dramaticidade? Cabe a quem quiser interpretar, eu mesma tentei transformá-lo em algo lírico como meus quadros borrados e minhas poesias dispersas que não chegam a lugar algum, como eu...

Normal...assim todos crêem ser sua realidade, e por  muitos anos também o fiz. Por alguns outros anos tentei ser “o contrário”, nunca me dando por conta que “o contrário” é guiado justamente por sua oposição.

Detesto, me envergonho, me sinto humilhada em me lembrar das vezes em que eu apanhei, mas envergonhada ainda em lembrar que gastei anos tentando raciocinar “por que apanhei”...literalmente...sequer tenho consciência se eu posso ter me tornado ré em diversas situações, calcada na falsa realidade que aquele sangue me tornaria eterna vítima, a que sempre tem razão, a mártir?

Pois foram nestes dias de sofrimento que eu nasci, antes disso  minhas realidades eram diferentes...

Como é a dor de apanhar de um pretenso amor? É o fim de tudo, a falta de sentido, a ausência do espírito , é a descrença, o inconformismo e a loucura. Não há Maria que console...nem Madalena, nem mãe de Jesus, nem da Penha... O que resta nesses casos, é simplesmente repensar o que é amor.

No início, eu me vingava de minhas dores rasgando meus quadros e me trancava em um quarto escuro, e hoje questiono como persisti na crença em Deus, se é que persisti.

Mas anos depois disso tudo, eu estou “Desaprendendo a amar”, é isso mesmo, desaprendendo. Isso não que dizer que eu não ame.

Quer dizer que eu, e talvez todos nós, tenhamos aprendido da forma errada. E ao reaprender, eu acho que vou ter que utilizar essa mesma palavra para um conjunto de químicas e sentimentos diferentes dos que eu me acostumei. Por que eu  ainda não sei perdoar...e...”não saber perdoar” faz parte de amar? Eu não sei a resposta...

A memória nos prega peças. As imagens são fortes. Acho que o indivíduo que perdoa facilmente é simplesmente aquele que consegue criar novos cenários, se apegar a novas imagens e apagar totalmente as antigas. Talvez a palavra “esperança”, seja um segmento desse processo, se a esperança fosse uma pessoa, seria uma pessoa que não olha para trás...talvez essa "pessoa esperança", não consigo sequer olhar para si mesma, ou para o seu lado, pois só isso já faz com que se pese os prejuízos...os danos irrecuperáveis que a violência pode trazer para várias vidas, quando ela passa apenas dentro de um lar.

Juntar clichês é o meu repúdio, mas existirá amor sem esperança? Nesse emaranhado de “anças”, confianças, esperanças, bonanças... CONFIANÇA...não entendo mais nada e descobri que meu corpo sempre me enganou, pois o amor não está só nele. O amor mexe com o corpo, mas nem tudo que mexe com o corpo, é amor.

Amar é apenas estado de espírito. O estado de espírito que dá significado para a vida. O significado de montar família, montar um lar, gerar filhos...pagar contas, comprar uma casa...são metas dignas de quem ama. Toda essa “rotina”, é o meio e não o fim. Prazer, abnegação...talvez eu seja platônica em acreditar. Não, eu não sou perfeita também, obviamente. Estou chegando a conclusão, que os perfeitos erram, e perdoam, e impreterivelmente andam para frente. Estou longe disso e próxima das mentes encarquilhadas e que olham para trás, criticando e tentando consertar as coisas no local e tempo errado...pois o que passou passou, e por definição, os nós embolados, assim continuarão se não os desatarmos seguindo em frente.

Círculo, repetições em ondas, de uma geração para a outra da família, cada barriga gera uma hipérbole dos seus próprios medos e neuroses...onde isso foi parar? Há conserto?

Não posso negar a frustração de que essa “sala de aula”, não existiu , compensei observando, escutando, imaginando e sonhando...que, quem sabe ela existirá no momento em que minha maturidade me permitir. Por enquanto, eu vou apenas registrar o meu curriculum vitae, aqui, da forma em que a vida me levou a escrever.

Entendi a poucos dias, que os sonhos não tem começo e nem fim, são geralmente fragmentos. Eu sempre escrevi fragmentos...e tento faz alguns dias, ter algum insight para decidir em que ponto eu vou começar a escrever minha história, terminar então nem se fala, eu não acredito que as histórias terminem...

Venta Vida!





A vida é a própria natureza, à vezes vento ou vendaval, calmaria ou temporal. Um relâmpago sempre a relampejar.Não lembro mais, mas sei que pulei  vários carnavais que correm paralelos em algum lugar.

É, parecem várias vidas, e quanto mais o tempo passa, se entende que tudo que vale o  mar não leva, o chão ruído não engole, as areias não cobrem.

O corpo está sempre indo, mas alma cada vez mais vindo. Plenitude.

Pai do céu e Mãe da Terra




É, o pai está no céu...e a mãe está aqui na Terra.

Que cada uma cuide do seu latifúndio, que ao que parece esse corpo mãe se encerra, de tanto germinar almas, há de murchar pelos seus filhos: os homens-árvore quimeras.

Ergue filho, o tronco! E acomoda sua raiz em minha loooonga esfera, vê que seus galhos vão subindo, subiiiiindo e desmanchando tooooda estratosfera, e suas raízes , mesmo assim estou sempre parindo, pariiiindo...por que amor é só o que minha seiva gera.

Desce filho! Sempre te ajudei a adubar a mim mesma, essa mãe terra que te espera. Ingrato que aguarda ansioso o caminho dos céus, planejando me abandonar como se eu fosse megera.

Arranca seu olhos agora! E tateia o que NÃO te pertence a vera...se aqui tudo é palpável, seu pai te paga é com ventos, graças, sentimentos e frios de inverno, sem flores de minha primavera.

Dor...ao te ver podando...caindo dos meus galhos, murchando os seus meus frutos...”fotosintetizando” o ar em poeira...secando como pimenteira...aaaaaai...

Me curvo. Chorando em total desespero...só mãe sabe o que é sofrer...seu pai te deu a vida...e etérea e intangível luz, eu gerei a madeira e para te consolar no colo, me disfarcei de cruz.

Escatologia




As nuvens se formaram repentinamente em forma de Zeus, ou de Deus, ou de quaisquer fenômenos escatológicos...e começaram a soprar, a ventar, a destruir todas as paisagens de cimento de colorido quase acinzentado, formando um caos. A pessoas corriam pelas ruas com roupas e cabelos esvoaçantes, aterrorizadas e livres. 

Todas as construções foram derrubadas deixando apenas cinzas, pessoas descabeladas e nuas. Seguido o desespero do nada ter, veio a bonança do “nada a fazer”, e todos deitaram relaxados no nada.

O chão foi se partindo e dele brotando luzes em neon...verdes, azuis, amarelos, formando árvores e flores em forma de andaimes reluzentes. As pessoas nuas se levantaram para contemplar, e os reflexos das luzes tornavam seus corpos vestidos e seus cabelos como que repletos de vaga-lumes.

Esses andaimes reluzentes foram vagarosamente forrados por matérias que pareciam luzes, penas, folhas, galhos, águas, estrelas, pedras...formas que todos conheciam apenas de seus sonhos e de sua infância.
O choque humano, fez com que seus pés criassem asas nos pés, como Hermes, e todos começaram a voar em torno de si e dessa nova realidade.

A tristeza da perda, e a saudade das imagens destruídas, causava em todos, instantâneas nostalgias, que eram imediatamente apagadas pelo brilho das novas cores e impressões.

Os cabelos...ah os cabelos...passaram a ter outra importância, eram o movimento do ar e a extensão dos sonhos...E não conhecíamos todas as cores e cheiros, não éramos nada antes disso, além de autômatos esperando a morte e a submissão de nossa matéria a fazer parte da matéria morta e árida.

Pois a matéria não é mais morta. Ela é a extensão dos nossos bons pensamentos e a ressurreição de todos os sentimentos nobres. As plantas são mais brilhantes, o céu tem mais cores que o azul e a vida vai muito além do nascimento e da morte, dando finalmente um sentido a vontade de estar vivo.

Ceticismo



Reflita: para que não lastime,
e ame para que não sofra.
Ou curta suas lágrimas
que são de seu mérito,
e de sua falta de reflexão.
Se orgulha de "ser vítima"?
Apieda-te de ti mesmo?
Este é o resultado
por ter sido surdo
à tua própria intuição
Cético! Pragmático...
Patética a sua falta de fé
no que na realidade
é pura razão...
Sofra mesmo,
se auto-diagnostique meu irmão...
...é moderno ter bipolaridade!
justifique e fique à vontade...
...tome remédios, beba...
vire às costas para toda verdade
ou abra os olhos para a saudade
se ajoelhe
e se apresente à humildade.
Enxergue que é lógico
fugir da dor...
Se só acredita na física,
na química e biologia:
Acorda e olha para a luz do dia
e raciocina que toda criação
tem um criador.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Procissão no interior




Sigo na procissão, e nessas ruas estreitas estreladas, de paralelepípedos milenares, sigo descalça, vestida de branco e rendas. Carrego uma pequena caixa com meus pecados, trancada, para que nem eu possa vê-los.

Para homens e mulheres, o melhor do mundo, é o fato de que nessa caminhada, somos apenas ignorantes, crianças caminhantes , anjinhos perversos seguindo errantes, na única direção que os anjos mais velhos puderam nos ensinar.

Que a natureza preserve os nossos joelhos, ou que surjam novos parceiros, que nos ajudem a de pé caminhar. Nesse caminho louvamos nossos altares, nomeamos   nossa solidão perdida, damos a ela forma, a vestimos roupas e a carregamos nas costas,  louvamos, apenas para conseguir continuar. Os bichos nos seguem, sem desespero, por terem recebido, do provável dono dessa procissão, a dádiva da ignorância...ao invés do infortúnio da razão.

Sim, devemos ser realmente pecadores, o nosso castigo é pensar...se fôssemos ainda animais, tudo que hoje  se encontra nessa caixa pesada, nessa longa caminhada, estaria em outra procissão: Liberto ao vento, no caminho dos rios seguindo os peixes, embrenhado no cio dos lobos mata adentro, no amor contido em cada elemento.

Quem nos dera, durante essa procissão, resolvêssemos voltar atrás, por algum motivo da natureza,  parássemos estupefatos, olhando uns aos outros de fato, e corrêssemos para o início de tudo,  despindo idéias, arrancando as roupas, adornos sociais, penduricalhos matrimonias... Beatas repetidas, velhos desanimados, meninos desamparados, caucasianas e mulatas, guerreiros e malandros, mendigos e magnatas... quebrando  caixas,  libertando almas, inspirando e expirando imagens...apenas viver já é caminhar, nossos caminhos não são ruas, encontram-se embaralhados na Terra, no céu e no mar. Esse, é nosso altar.

E finalmente percebendo, que tudo, tudo é sagrado! Cada pecado por nós mesmos condenado...e assim sendo , nesse momento, retrocedêssemos nossas orações, aos idiomas, a antes das palavras e palavrões, aos grunhidos, que seja em gemidos,  dirigidos assim á perfeita impossibilidade,  e ao verdadeiro sentido de rezar. 


Ouvindo a Mãe Terra





Sim, eu sou mulher, eu pari o mundo e posso muda-lo só com meu ventre.

Guardo comigo a solução dos bichos, o mal dos homens e orgulhosamente: todo pecado do passado,  futuro e presente.

Ignoro o destino tomado pela razão, me encontro soterrada no elo perdido da paixão.

Mas sou extremamente forte, pantera atiçada pelo perigo de nossa atual condição, onde os filhos passam fome, meus hormônios explodem salvação.

Usina radioativa é usina do homem, a minha energia é a compaixão.

Me manifesto na natureza... Reverto minhas lágrimas em tsunamis, meus ciclos nas luas, meus temores nos vendavais.

E a chance dos meus filhos, é ouvir a mãe e quem sabe até descrer no pai: Se suas ordens não mudaram o mundo, não deveria tê-los deixado, passar de animais.









Troféu estranho






No silêncio do tentar escrever, meu corpo me diz que não passa de morada de várias mulheres perdidas no tempo. 

Elas me sussurram que  não se importam com as coisas que não conquistei, me informam democraticamente que ainda tem que me gritar onde eu posso chegar, e seu eu não sei, elas vão me guiar.

 Joana me grita que suas queimaduras ela me empresta de escudo, as mortas como bruxas me pedem para pecar, as santas não canonizadas se esvaem de choro em algum canto meu, rezando pelo meu não desfalecimento. 

As do céu me jogam suas asas e me dizem para eu me levantar, as do inferno me dão dicas de Caronte, Hades e Thánatos para que eu possa ludibria-los e continuar. 

Que meus filhos digam:- essa é minha mãe! Aquela que provou que se pode viver do que" não era." A que calou aqueles que acreditam que a vida, só existe pelo do que de ti, esperam. A que ouviu os loucos sem medo de sê-lo,  que cala os sãos, sem medo de não tê-los.

 Nada mais me importa.

O mundo borbulha estático nesse momento, fora da minha sala verde penumbra, onde sentada no meu trono imaginário, entendo que meus dedos conduzem  minhas revoluções a  transformar tudo que era para ser ócio, em criação.

Calo a todas e informo, que eu quero dinheiro!  O estranho troféu sem sentido! E o quero, pelo que ninguém espera. Quero-o pelos milagres que essas insanas podem me proporcionar, quero ser paga pelo meu mais profundo e absoluto mistério, pelo gozo do inesperado, pelo adormecido,  esquecido, ou morto estando nesses perdidos, todos os meus achados.



terça-feira, 17 de abril de 2012

Altar





No, I do not want to die, like the ones I love are gone! I want to be drunk sober until my last breath.

Imprisoning me shiver, I feel them forever!

Please ... I do not want to turn nothing static.I ask my dreams, they bring me wheels, tires, slingshots and catapults, as I shoot my verses, I sweat a joy!

I swear, I do not want to live in harmony! I want to be squeaky violin at night, to comfort my brothers in the light of day.Knot tied in agonized sleep, Penelope carpet on the floor of calm.

I want to die every time I get to my destination, to revive and I find myself and a new place, losing, finding, losing, birth, death, birth, lose, find ...

Body, this Greek! Blessed Cursed!I exorcise my soul to imprison you,I am warrior: Slave! That armor needs to shine ...I get used to their scrapes, the rest of my ill-treatment, itching, scars, stops rays of my passions, torpor, pleasure and moans, whispers, pops, I feel my throat growl,succumbing to your pleasure, my uterus ever give birth, menstruate, ovulate, oxygen synthesize ....I'm on my knees in the mirror, revere you.

...unfair ... always praised my soul in the first place ...I beg you, forgive me and hugs me, eat and drink yourself, while I stay.Takes my heart, heals the body!And one day, let me leave with decency...Please do not envy me because I'm there. My companion banished from paradise!

I scream: Body!
The Earth is its altar.
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Não, eu não quero partir como os meus que se foram! Eu quero estar embriagada até o meu último suspiro.

Aprisiono sorrateiramente meus arrepios, eu quero sentí-los eternamente!

Por favor...eu não quero virar nada estático. Peço aos meu sonhos que me tragam rodas, pneus, estilingues e catapultas, pois quero disparar meus versos, eu quero suar alegria!!

Eu juro que não quero viver em sintonia! Quero sim ser violino de noite desafinado, pra afinar meus irmãos na luz do dia. Nós atados no sono agoniado, tapete de Penélope no chão da calmaria. Quero morrer toda vez que ao meu destino eu chegar, pra eu reviver e me encontrar e um novo lugar, perder, encontrar, perder, nascer, morrer, nascer, perder, achar...

Corpo, presente grego! Bendito Maldito! Te esconjuro a em minha alma te aprisionar, guerrilheira que sou:  Escravo!! Essa armadura precisa brilhar...me acostumarei com seus arranhões, resto dos meus desmazelos, comichões, cicatrizes, para raio das minhas paixões, torpores, prazeres e gemidos, sussuros, estampidos, quero sentir  minha garganta grunhir, ao seu prazer sucumbir, meu útero eternamente parir, menstruar, ovular, oxigênio sintetizar...levo corpo, seu joelho ao espelho para te reverenciar.

Injusta...sempre louvei minha alma em primeiro lugar...Eu te peço, me perdoa, e me abraça, me come e me bebe enquanto eu  ficar. Acolhe minha essência, te cura corpo! E me deixa um dia partir com decência, não me inveje por que sou de lá, companheiro do paraíso banido!

Eu grito: Corpo!!
A Terra é seu altar.

Fígado de Prometeu




Como você ama? Eu amo como eu aprendi a amar. Sempre achei que não. Me julguei peculiar. Mas eu amo, exatamente como fui ensinada.

Por que? Por que a MINHA maneira de amar eu desconheço, ela se encontra perdida, afogada e escondida...e bóia em fragmentos dos meus sonhos, que eu, como pescadora “amadora”, tento fisgar...no que antes era um riacho, que se tornou um rio, hoje uma praia, amanhã quem sabe um dos oceanos, o oceano de idéias e pessoas que eu realmente sou.

Nesta minha praia, amor sequer tem nome. Pois fora desta praia, e ele veio exatamente de fora, programado e determinado, sequer comparável a qualquer elemento espontâneo da natureza. Eu, talvez todos nós, tenhamos aprendido a amar, como quem aprende a montar um objeto, que é encomendado, chega rotulado e com manual...sempre com defeito de fábrica ou garantia. Ele é bonito ou feio, grande ou pequeno, barato ou caro. Um produto. Finito.

Não, nos meus mergulhos eu sinto que ele não tem fim, forma ou valor. E quando acordo, sinto que erramos, e erramos muito, justamente por termos aprendido que ele é resultado de uma ciência exata. Ele é inexato. Ele é inexorável? Não...é flexível!Indestrutível? Não, ele não pode ser destruído, pode ser abalado, transformado e reconstruído, é um fígado de Prometeu.

Não quero




É muito natural:
Eu não quero mais.
Pela ambição,
galopei como um corcel
Ela ficou para trás
Acordo apenas
querendo estar em mim
e nada mais...

Universo Melancolia



Mas como segurança? Se moramos em uma bola que flutua no nada...Desconheço meu próprio universo, sempre em expansão e não estou certa se rodarei sempre em torno do sol. Não me protejo dos corpos celestes e pode cair um asteróide, ou quem sabe: A terra mal acomodada pode abruptamente tremer estourando usinas.

...Buraco negro, que me faz pensar que apenas existimos pela impossibilidade do “nada”...tudo longe e desconhecido...Onde haverá recursos para outras formas de vida? Outro acaso como nós?

Humanidade!!! Às vezes olho a minha volta, e por mais que eu tenha minhas crenças, eu refuto a possibilidade de não sermos nada, não termos realmente importância alguma, de termos o acaso da inteligência nos fazendo crer que somos mais importantes do que cada gota do oceano, cada poeira cósmica. Me distanciando de “Deus” a cada dia que se passa, me aproximo de uma força maior. A que tira de mim toda arrogância e prepotência de crer que sou privilegiada acima de todas as coisas. Abro mão dos privilégios  e me coloco na mesma altura de todos os seres vivos. Esta força seja lá qual for já me guia independente dos meus pedidos, com o mar, o vento e as estrelas e não as culparei por qualquer fracasso. Eu peço perdão por todos nós e sou agradecida a essa natureza por me proporcionar a experiência da vida. Agradeço pelo cosmos e quem sabe a alguma conjuntura estrelar por me permitir ser uma observadora neutra. Acho realmente tudo estranho e engraçado, as preocupações, os valores...isso por que não consigo pensar apenas no aqui e hoje, no riso fácil...não dá...

Objetivo. Isso eu quero continuar crendo: que todo esse conglomerado de coisas, formas, vidas, valores...tem um objetivo. O único que consigo imaginar é o nosso crescimento, estou longe de entender o por que... mas temos que crescer, amar, ser solidários...para que nos tornemos...Será? Será que existem criadores e criaturas? Acho que sim...então, enquanto não passamos de criaturas vamos aguardar “as ordens” dos criadores, sejam eles deus, deuses ou seja o que for que nos tire a responsabilidade do destino das coisas.


Heróis da África

Se eu sou brasileira,
Meu herói fala iorubá,
Anca parideira!
e quando minha maré é baixa,
e as águas estão tranquilas:
O meu mar é morto,
Filha daqui quando sossega
Chama Iansã pro vento soprar,
A mestiça quando está sem idéias,
Clama por Iemanjá
Atira rosas na praia
Pras suas ondas movimentar.
Filhas do sol
Dançam á lua
ao som batuque ,
mas aguardam em silêncio,
Obá trazer o inusitado,
O vendaval e o maremoto
atiçando o que estava parado...
Corpo da primitiva cresce
E a alma revela:
Chegou Oshossi!
Ele puxa o bicho,
Que chama Nanã
Pra ajudar a flor do mato
Obá acompanha
..E Oxumaré
chega com sua transformação.
Xangô!
Só pra consagrar
Neta da África
Brasileira mulher leão

Especialmente para Kátia Marina, que pariu meu grande amor

quinta-feira, 12 de abril de 2012

New citizen of the world,




Cineastas e escritores previram nosso futuro frio, cinza, sem rebolado e com seres ou completamente éticos ou de retorno a barbárie. Retorno? O futuro, hoje presente é colorido, musical, sim: tecnológico. Dr. Spock não é o nosso auto-retrato...esqueceram inclusive que todas aquelas tecnologias idealizadas no “onírico”, seria hoje movimentada por um emaranhado de marcas, formas e designs, que por conveniência, são altamente perecíveis.

Rebolamos! Compramos! Nos gabamos pela nossas “mentes abertas”...caucasianas usam rastafári, negros criam passado glamuroso inexistente, morenos, mulatos e mamelucos...se vestem da mesma forma, e provavelmente pensam de forma igual...pensam de forma igual e ainda acham isso bom.

O corpo não possui sentidos o suficiente, enclausurados pela lenda de Rômulo  e Remo, nascemos numa selva de tecnologia, a qual estamos atrelados ainda em face de nossa própria selvageria. A selvageria que nos mataria na ausência destas máquinas, tal como nos fosse tirado o leite da loba.

Urbanidade nos traduz. Mas, o que traduz urbanidade? Pois somos urbanos de fato por sobreviver em selva de pedras e chips, porém o sinônimo “afabilidade”, “possuir sociabilidade”, são hoje questionáveis e relativos. Fazer parte desse todo, que tem a pretensão de ser segmentado mas é único, ignorante por se achar peculiar apenas por vestir roupas de estilo diverso  e possuir gestos diferenciados. Diferenciados? Se nomeam éticos, ecológicos, sustentáveis..

Ética, para mim, como eu enxergo em meus “contemporâneos”, é um adaga viva, que se modifica de acordo com a conveniência de outrem e dos tempos, e quem a leva a sério e a classifique como imutável, que se prepare para que ela, apontada para o seu coração, te fira, e se não te levar a morte: aguarde calado a sua miséria.

Pois o “novo cidadão” é mais a armadura do que o herói, e foram todos construídos com a mesma matéria, mesma empresa e mesmo idioma que por se considerar global, se tornou... Idioma que ultrapassa a semântica e o léxico. Um enorme idioma de sentidos e símbolos imutáveis. Robôs com vida própria, que procriam, nascem, crescem e morrem sem questionar os por quês partindo do zero...pois é para esse zero que deveríamos voltar constantemente.

Se movem pouco, copiam e colam, consideram que a expressão é quase extinção. Só vêem sentido no que faz sentido. Extinguiram totalmente de seu consciente: Os caçadores, as bruxas, os alquimistas, os profetas, os pensadores, os heróis, os pintores, escritores, palhaços, mendigos...Isso por que somos os mestres da “classificação”, somos aqueles que “decodificam”, empilham e separam seres em caixas.

Orgulho? Nem de mim por estar afogada por omissão, neste vendaval de valores perdidos. Terremotos, maremotos, tsunamis, guerras externas não reverberam na placidez inabalável das terras planas e internas de nossos conformismos.

A emboscada - The ambush





I've been doing collection of tarot cards, not mystical issues, but issues mythical.One of the exercises I learned in art therapy is the use of these letters as a joke for the very logical break a supposed seriousness, and symbols are always powerful when it comes to action on behavior. Funny that, because the person who first became interested in knowing how it works, my son was more logical.Relaxed reading the book to understand the deck, whose theme helped him relax: A deck of Leonardo Da Vinci.

I like to play, especially for access brings you to some people, open doors, and anyway, even if by synchronicity, the letters lead to a reflection.

Friend wanted to train me for this deck, taking out the cards for me, the question I asked was: I got to live in "words" ¿The first letter defines the content of the question, the letter came from "the ambush", I got My friend looked at each other, trying to adjust our thinking to fit this card into something concrete.

I taught computer classes for many years, she held for long,I'm not spitting on the dish i ate. I was very helpful and within this "craft" of teaching, and I was "learning to learn": I could not  to study anything officially, because that would jeopardize my livelihood and livelihood my two sons. I was doing with the lemon, one sweet lemonade: Breaking barriers, studying the way that was possible ... If I started teaching basic computer, over the years I specialized in computer graphics, and my thirst for knowledge led me to teach for creative professionals, where with these, I learned much more than I taught.

The life led me to rotate between several "Erikas",  at the time I arrived at the place where the need has led me to believe to be correct, I realized that I was betrayed by my ego ... and this time in my life,I did not want nothing less than to prove to others that I could get somewhere. And I got.

Looking back I saw all my girls, and smiles, lost, abandoned... Abandoned paintings in dreams, other writing, others simply could not stand the pain. They suffered, dived in pain for at least three years, and decided to disappear to make way for an intruder, that did not look back. If there is no point plunge in pain,  will feel miserable. I could not follow this path.

The "most powerful Erika", had been silent, embarrassed, humiliated, tortured in the most literal sense possible. The others ... were also important, but led me to a labyrinth, whose output was not possible for them, way too small but so limited that I ended up in "Ambush," is there, my card in the deck.

Reflection of fate ¿Does he creates that this maze whose exit is only possible if we take paths consistent with the "Our most powerful I" .  "I had no way out," .. is ... it happens.

When we arrived at this moment, just what brings you passion, will set you free.

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Andei fazendo coleção de cartas de tarô, não por questões místicas, mas por questões míticas. Um dos exercícios que aprendi em arte terapia, é o uso dessas cartas como uma brincadeira para pessoas  muito lógicas quebrarem uma suposta sisudez, e os símbolos são sempre poderosos quando se trata de ação no comportamento. Engraçado isso, por que a primeira pessoa que se interessou em saber como funciona, foi meu filho mais lógico. Descontraído lia o livro para entender o baralho, cujo tema ajudou a descontraí-lo: Um baralho de Leonardo Da Vinci.

Eu gosto de brincar, principalmente pelo acesso que te traz a algumas pessoas, abre portas, e de qualquer forma, mesmo que por sincronicidade, as cartas de levam a uma reflexão.

Amiga quis treinar comigo por esse baralho, tirando as cartas para mim, a pergunta que fiz foi: Eu vou conseguir viver de “palavras”¿ A primeira, carta que define o conteúdo da pergunta, veio a carta “a emboscada”, ficamos eu minha amiga olhando uma para outra, tentando ajustar nossos pensamentos para encaixar essa carta em algo concreto.

Eu dei aulas de informática por muitos anos, me prendi a esse ofício, por que de certa forma ele me salvou, não cuspo no prato que comi. Me foi muito útil e dentro deste “ofício” de ensinar, eu fui “aprendendo a aprender”: Eu não tinha mais como, na altura da vida que cheguei, parar tudo para estudar oficialmente, pois isso comprometeria o meu sustento e dos meus 2 filhos. Fui fazendo desse limão, uma doce limonada que suas vitaminas se reverteram ao que minha saúde necessitava: Romper barreiras, estudar da forma que fosse possível...Se comecei a dar aulas de informática básica, com o decorrer dos anos me aprimorei em aulas de computação gráfica, e minha sede de conhecimento me levou a dar aula para profissionais de criação, onde com esses, aprendi muito mais do que ensinei.

A vida me levou a me revezar entre várias “Erikas”, e elas se tornaram tantas e tantas, disfarçadas dos diversos escudos que tive que empunhar, q ue no momento em que eu cheguei no local, em que a necessidade me levou a crer ser o correto,  percebi que fui traída pelo meu ego...e que nesta tal altura da minha vida, eu estava nada mais nada menos, do que provar para os outros que eu conseguia chegar a algum lugar. E cheguei. Olhando pra trás vi todas as minhas meninas, moças e sorrisos, perdidos, abandonados, onde eu as abandonei¿ Algumas eu deixei pintando nos sonhos, outras escrevendo na mente, outras simplesmente entorpeci...por não suportar encarar sua dor. Elas sofreram, mergulharam na dor por pelo ou menos 3 anos, decidiram sumir para dar lugar para uma intrusa que não precisaria mais olhar para trás. Esta mulher aqui que passou a se achar muito forte por conseguir “superar” seus problemas, ainda não havia compreendido que superar é fazer as pazes. Consigo mesma. Se de nada adianta mergulhar na dor e se sentir miserável, de nada adianta também, que em detrimento da fuga desta dor, fujamos dos caminhos onde neles estariam nossas principais paixões. Eu não consegui trilhar esse caminho. A “Erika mais poderosa”, havia sido calada, envergonhada, humilhada, torturada nos sentidos mais literais o possível. As outras...eram também importantes, mas me conduziram para um labirinto, cuja saída para elas não era possível, caminho tão restrito, mas tão restrito, que fui parar numa “Emboscada”, está aí, a minha carta do baralho.

Quando chegamos a um momento, em que nada parece ter saída, esse é o momento em que apenas o que te trás paixão, é possível. Reflexão do destino¿ Será que ele cria esse tal labirinto cuja saída, só é possível  se tomarmos caminhos condizentes, com o “Nosso eu mais poderoso”¿ Sem esse ser, não somos inteiros, abandonos pessoais, que vão nos tornando “frangalhos de nós mesmos”, fracos, impotentes que sequer conseguem enxergar todos os caminhos possíveis¿


Tesouro Primitivo


Eu tenho memória de um fato, que só ontem eu me dei por conta, o quanto e como ele foi importante para mim. Algum pensamento encadeado, me fez lembrar do momento do parto do meu segundo filho, o primeiro parto que fiz foi cesárea e o segundo foi parto normal. Me lembrei do momento em que “expulsei” Lucas de mim...as enfermeiras gritavam empurra...empurra. Eu não fiz força para empurrar, mas houve o empurrão e grunhidos que ocorreram de forma totalmente  alheia a minha vontade, uma sensação muito agradável, difícil de descrever, como se a natureza se apossasse de mim e tomasse minhas rédeas,  um empurrão. Minha garganta se abriu e literalmente grunhi...

Hoje estou vendo esse momento, como um contato supremo com nossa natureza primeva.“Nossa” em função desta memória definitivamente não ser minha visto que foi meu primeiro parto normal. Nossa, por que todos nós temos guardada, nossa natureza primal.

Encadeando um pouco mais com outras sensações que vivi, levo fama até hoje de geniosa, pois quando eu era criança, quando passava por determinadas situações que eu necessitava de defesa, me modificava, quantas vezes, ouvi de minha mãe “segura ela”, pois só de olhar para os meus olhos cerrados e a mordedura da boca segurando os lábios, que ela sabia que meu próximo evento seria atacar. Ainda sinto isso em algumas situações, e quando isso está para chegar, eu peço para ficar só. Por que a natureza nesse tempo, já me colocava em suas rédeas.

Não sei por que acontecia, se isso foi resultado do meio, ou essa natureza em mim, já nasceu aflorada, mas fiz questão, de muitos anos para cá, de tirar a natureza do comando, e deixar minha razão na montaria.
Porém, além de ter me poupado de uma série de desconfortos,  me privou de um grupo de intuições que montavam em mim junto com a natureza.

Ontem eu discuti com minha filha: Como ela não queria acordar, eu simplesmente peguei o filho dela para cuidar neste dia, e ela resolveu deixar virem  buscar o filho dela numa situação que certamente traria riscos para a criança, porém o raciocínio de que, quem deveria ter tomado conta dele, deveria ser a mãe e não eu e de que aquela criança não poderia  entrar nessa situação de perigo,  foi crescendo, e de repente, entrei em um processo de mau humor, fora do meu controle, pedia para ela me deixar só no quarto, cheguei a escrever para minha mãe, alertando que eu iria estourar, expliquei que mais uma gota eu perderia o controle...Marcela quis forçar para entrar no quarto, e eu a empurrei, com todas as minhas forças para que ela saísse. Pronto...lá vem a danada de novo nas minhas costas, o pior...nas costas dela também. Brigamos, feio...ela gritava que não queria assustar o filho que eu parasse de vez por todas de brigar com ela.

Bom... a chave para a briga, foi justamente ela se ausentar da proteção do filho, como que de repente a preocupação dela, era proteger o filho¿

Depois disso ela foi se acalmando, e tomou a decisão de realmente não expor o filho aquela situação...pensando hoje nisso, cheguei a conclusão, que não foi minha conversa que ajudou a tomar uma decisão: foi simplesmente a primeira vez que vi a natureza montar nas costas dela, e ela por si só, mostrou para Marcela o caminho correto.

Entendi então, lembrando de diversas passagens, que Marcela está completamente desconexada com essa natureza primeva, compreendi o quanto ela é necessária, compreendi também quais as coisas boas que ela me trazia e mentalmente, separei das coisas ruins.

Temos um tesouro intuitivo,  que é a chave de ligação para nossos instintos,  neles estão guardadas  muitas, mas muitas habilidades, que não exercemos, capacidades que nos foram transferidas e desconhecemos.
Essa ponte da intuição, é capenga em Marcela