sábado, 22 de outubro de 2011

Moça Hipérbole



(Imagem de Perséfone)
Eu tenho em mim uma hipérbole,
onde tudo nela é mais.
Perséfone...
É uma moça de sangue quente
Perdida no cais
e de modos italianos.
O choro dela é mais estridente,
as dores mais profundas,
o riso mais frouxo
 o gozo mais indecente.
É ela a parte do meu prazer
e me promove riscos,
não se importa em maldizer...
é a que tem sede de liberdade,
vontade de fugir,
desprezo pela verdade
atração pelos prazeres vãos.
Prevenida guarda:
 Duas moedas para Caronte,
o alimento para Cérbero,
e uma coroa para Hades.
Crê ser esse rio, a ponte
para o descanso que morreu...
perdendo seus escrúpulos
mas encontrando seu eu...

Dimensão



Somos uma ampulheta, e a quantidade de areia que está dentro dela, a velocidade que ela se esvai...somos nós que projetamos dentro das limitações que a “civilidade” nos permite. O fato é que ela gira quando a areia se acaba, tornando um ciclo sem fim...nesses giros nossos horizontes se abrem, a vida se torna maior assim como nossas capacidades.
Ainda não há uma definição única de felicidade, e talvez nunca haja...porém, mais uma vez nosso idioma, amarra diversos significados a apenas um símbolo, pois quais são as alegrias dignas? Só teremos um breve noção do que é felicidade profunda quando nos desintoxicarmos de nossas experiências sociais, que nos fazem acreditar que o outro tem que compartilhar da nossa felicidade...apreciar, bater palmas para o nosso sucesso, sucesso...ou seja, a alegria está normativamente ligada ao quanto somos admirados.
Singularidade...exige coragem. Não somos mestres, somos de um tempo onde maior parte das invenções foram inventadas, quadros foram pintados, filmes feitos, filosofias construídas. Somos filhos não singulares, e nesse mundo já pronto, aos nossos olhos estreitos, nos parece que só nos resta usufruir. Usufruir coisas inúteis, inúmeras e que cabe no universo particular que construímos: Na nossa casa, no nosso carro, na nossa beleza.
O céu, e tudo que está nele não passa de uma vista que ilustra o mesanino de uma construção perecível. Ele simplesmente é uma paisagem, que existe por que vemos. E vemos pouco. Sentimos muito e sem qualidade.
Sofri sempre, por enxergar que tudo que temos acesso não passa de uma grande ilusão emprestada por tempo limitado. Vejo pessoas perdendo...perdendo...e ficando contentes pela sorte de recuperar o que perdeu...afinal, só se pode recuperar, o que já se teve de posse. Mas e o novo? O mundo em sua totalidade ainda se encontra no desconhecido...perdemos é  tudo que desconhecemos...por isso a vida ainda é frágil. Por que tudo que desconhecemos, está sempre entre nós como fantasmas que não podemos ver ou tocar.
Prefiro e aprendi a acreditar que estamos aqui visitando família e amigos...estamos aqui para crescer juntos...a sensação de que estou em um trecho da minha passagem me faz continuar trabalhando e aplacando meu medo. Construir? Sim, mas lembrando que em determinado momento tudo vai ter que ficar, como que num almoxarife, aguardando que outros possam usufruir e tornar suas vidas mais dignas. Dignas...Alegres
A alegria pura não pede aplausos...e se a sua já te pediu algum dia, me apiedo pela sua fraqueza, pelo seu desinteresse por si mesmo e pela morte dos seus mais puros desejos, aqueles  que te tornariam uma pessoa singular.Pois para cada indivíduo, a vida tem uma dimensão: A dimensão do desconhecido que ele pode enxergar com um critério só seu...as várias releituras do que pode ser real. As imagens desse universo que construímos com nossa própria e mais pura essência, são as imagens que cruzarão conosco de forma mortal ou salvadora.


A morte


É...a vida continua, e a morte a desmistifica, a simplifica e a torna banal.
Só perdendo alguém nos damos por conta, finalmente de  que tudo é passageiro, pouco é nosso e quase tudo emprestado. Como e pra que continuar essa jornada? Sorrindo? Sorrir na certeza de que aqui somos clandestinos é muito difícil, mas vale o esforço sorrir para ajudar aos que estão no início de uma caminhada, e na certeza de que solidão é apenas saudade que um dia vai ser esgotada.
Talvez eu tivesse acreditado até hoje que a fé me traria um 0800 espiritual  de consolo...onde com uma linha direta, eu teria notícias daquele que sempre quis saber a hora que eu sairia ou iria chegar. É as notícias não chegam mesmo, e eu me sinto talvez como ele se sentia nas noites em que eu saia sem dar notícias e ele ficava me esperando na porta. Eu sei que ele está lá, mas não sei como, isso é desconfortante, além da saudade.
A fila anda...é isso também que a perda te mostra...continua caminhando e de cabeça erguida...faz algo que ele tenha feito, e coisas que ele deixou de fazer...tenha tempo para seus filhos...ame...seja carinhoso...diga hoje o que sente...trabalhe muito sem deixar de relaxar...
Certa vez uma amiga me disse que amava muito o marido, eu a perguntei o que ela faria se ele fosse para uma guerra, ela respondeu prontamente que se casaria novamente, eu respondi: -Pois é, a um filho, se espera. Pensei outro dia: -Será que minha avó, depois de anos desencarnada, ainda tem o mesmo sentimento por mim? Deixamos de ver amigos por anos e quando os vemos, sentimos como se fosse outra pessoa. Me lembrei dos laços eternos, aqueles que o tempo não rompe. Acho que eles existem sim. Apesar da perda, acredito que em algum lugar ele e outros laços que cultivei, que consegui amar apesar de desavenças, que consegui perdoar e ser perdoada, que não se mantiveram por valores superficiais...estão aqui e lá, perenes, na verdade, a única força perene da natureza, e é por ela que devemos continuar sorrindo.

sábado, 19 de março de 2011

Pousando

Não tenho tido vontade de escrever...por que me senti tão livre que não pude me conter, precisei voltar. Mas voltando, sendo o que eu tenho que ser, ou o que eu sempre deveria ter sido, parecendo ser assim que eu me encontro, na realidade de mim eu me afasto. Tenho tentado andar pelos quarteirões estando neles e não em outro mundo, tentando pousar, é difícil ter os pés no chão ou enxergar o grande no pequeno, o mágico no simples, mas isso é se manter são e vivo. Estou voltando e não sei pra onde e não gosto de voltar. Repudio as prisões invisíveis aos outros e para mim disfarçadas de lojas, escolas, restaurantes, calçadões...mas eu preciso delas. Não me sinto autômata e isso fez de mim uma estranha que hoje reconheço. Bisbilhoto medos alheios, catalogo a mesmice desapercebida e me choco com a falta de sentido do próprio sentido. Rotina. Maçante e necessária rotina. Tenho tentado participar dela travando uma batalha com o óbvio, me sentindo o fantoche ao menos subversivo. Um pensamento me faz suportar: Nada é mais concreto do que as lembranças. Nada é absoluto senão o sumo do dia-a-dia que os anos levam. No final das contas quem decide tudo sou eu, independente do que possuo ou não, sou eu que conto minha história.