sábado, 30 de junho de 2012

Insone


Não sou insone, tenho pena de dormir e perder meus sonhos. Tento arregalar meus olhos para que quando eles chegem, eu os encare de frente.

Quando eles se aproximam, são trazidos por manadas extintas de mamutes, e sobre minha cama, a sinto vibrar anunciando a chegada dos seres que já se foram, mas gritam dentro de mim, e chegam pisoteando minha alma...espalhando ela no chão desbravando meus esconderijos desconhecidos.

Eles sem dó derrubam meus muros, e abrem caminhos para que eu possa passar, sem me perder. E eu não me perco!


Com os olhos inchados, subo no primeiro mamute da fila, me esforço aos poucos me equilibrando para ficar de pé...

...e fico, estendo os braços o máximo para o alto, junto com minha cabeça inclinada para trás e sorrindo, passo com minhas mãos, em milhares de pedaços de pano, pendurados dos céus, colchas, retalhos, fios cordas, e como um fantoche, por eles vou me equilibrando, ou guiando...

...Guiando essa manada para pisar destruindo as idéias que me fizeram sofrer, escuto o surdo rachar de pedras se desfazendo em areia, abrindo um amplo terreno sem paredes.

desço, e no sentido perdido das coisas, acho os meus pedaços relevantes, cacos...migalhas, vidros, graõs de areia, restos de lixo...sobra pouco que é realmente meu.

Mas a manada ainda me espera, com calma observando, eu sentada como em caixas de areia, juntar os restos, empilhar, montar torres, de restos de demolição, me transferi pra minha infância na beira do mar, escolhendo o ponto certo para cavar e gastar minha forças pra levantar um castelo, ciente que a água vai desmanchar.

Mas nada me aborrece, se esse ou muitos foram destruídos, pois se eles se foram, eram fracos...e terei sempre manadas maiores para me ajudar.



Meu Dorian



A dor hoje me fez arrancar minha pele...numa força semelhante a de um apaixonado arrancando a roupa de uma mulher.

Eu fiquei nua, e ao passar as mãos em meu corpo, eu senti relevos, rios e ranhuras, vi minha pele acinzentada...em várias partes do meu corpo, cicatrizes e feridas abertas...não há como nomeá-las como mágoas, prisão ao passado ou desejos de vingança.

É apenas o meu Dorian Gray, que não está numa pintura, mas se embrenha em minha alma, quem sabe alterando meus D.N.As...

Pobre ilusão de quem crê que a violência é uma mulher submissa que fica parada lá, no lugar em que nasceu...ela me acompanha, pois em algumas curvas da minha vida, me deparei com tapas, gritos, socos e pontapés, que gostaria eu de ter o poder alquímico de dissipar.

Por que às vezes eu creio que ela, a violência vivida, nunca me moveu. Mas dilacerações irrompem gerando lágrimas, tal qual um animal uivando no breu da noite, intuindo a chegada do perigo.

O perigo que já foi condicionado a se repetir, pelos meus pais e quem sabe será procrastinado até o fim da estadia dos meus filhos.Eu não consigo ver isso se dissipar...

Hoje um "algoz" do passado, veio me dizer vírgulas, que entraram em mim como exclamações, que me gritaram para olhar para trás...e eu olhei: me deparei com o local em que fiz a curva da dor, da falta de respeito e da violência.

A cada ano que se passa, creio na desmaterialização dessas forças, mas hoje eu as vi como sombras, nos cabelos do meu anjo descendente recém nascido.

E quando esses eventos me fazem olhar pra trás, eu sinto a dor de um bicho, acrescida as lamentações humanas...e por isso, eu nem sei mais o que sou, quem sabe um ser intermediário entre lobos e homens, cujas garras saltam invisíveis em um simples caminhar nas ruas, quando vejo coisas que para minha "humanidade" dilacerada, não fazem sentido algum.

Eu me sinto a usina do sofrimento alheio, pois em todas as fisionomias doridas, encontro pedaços de minha identidade.

O que fazer se alguns monstros meus me puxaram pra fora, de tanto que tive que confrontá-los de frente, o mais dentro de mim o possível?

E isso eu sou.. uma criatura montada em pedaços de mazelas minhas e alheias...que no momento maior da tortura, se vê bem de dentro em cantos obscuros, cemitérios de diversão...perambulando entre as covas dos meus mortos, tentando ao menos lançar coroas e guirlandas para homenagear meus castigos.

É essa penumbra que está sob a carcaça, que está sob minha pele. Um ambiente tentado ser reconstruído e lapidado, por meus personagens que só tem força de marionetes, pois só o onírico pode organizar ou embelezar os meus palcos queimados.

Por sorte, aprendi a parir fantoches eficientes, e eles me trazem as letras para eu manipulá-los, então enquanto escrevo, eles vão trazendo dos céus carruagens repletas de cores, pincéis e brinquedos, e lenços...e vão me consolando, enquanto pintam as minhas paredes com Tolouse, me dão um lenço para eu secar meu rosto e me fazer sorrir.

Eles seguem mambembes e malandros, montando mais salas floridas do meu velório do dia , de vários personagens que já tive, assassinados e nascidos.

Me levam para um lugar e me mostram, de pernas abertas e uma fêmea gritando, puxando mais uma vez minha nova criança nascida, tenho vidas curtas entre uma dor e outra. Quem me empurrou, me matou, me ressucitou? A princípio a violência no seu estado mais nu e cru...que podia ter me levado e jamais me trazido de volta, ou ter me deixado simplesmente estacionar, mas agora, sou eu quem faço questão de sempre morrer e nascer.

E depois de tudo composto, ou recomposto, essa criaturas abrem o meu caixão e me pegam pelas mãos, e apagam todo o resto de dor vermelha ou cinza...e me sussuram que cresci mais um pouco, e me pedem para eu sair do mar, emergir das emoções, e trafegar para a razão.

Olho pro mundo, o reconheço e tenho piedade de tudo e de todos, do algoz e da vítima, mas não sei definir se as ruas são  meu espelho, ou eu sou delas. Só sei que como Dorian, minha imagem externa não traduz um milésimo dos meus tormentos. E infelizmente às vezes eu preciso olhar pra eles e continuar correndo, correndo na outra direção.

Então eu trafego para a direção da razão, logo depois de acarinhar essas feridas, sem reclamar, fantasio que são simples tatuagens da alma, e visto minha pele de volta. E meus personagens mambembes puxam meu rosto pra olhar pra fora, e partem me deixando sob a tutela  de outras feridas.


Surgem então, as parte do meu Dorian, que são meus personagens intelectuais, e eles me  mostram os  mestres que me ensinaram que felicidade pode ser melancolia, visto que ela não é simples sinônimo de sorrir, sim de plenitude, o que fazer se demos nomes únicos para conjuntos de sentimentos indescritíveis? Da mesma forma que determinados desmazelos físicos são irreversíveis, determinadas condições humanas, individuais, também. Nunca obrigue alguém a sorrir, nunca subestime o poder da dor daqueles que a tem costurada em suas vísceras. Nunca, mas nunca diga para essa pessoa, que ela não é digna do sucesso. Não tente bater na sua porta aos domingos, com um folheto de como alcançar o céu, muito menos com um livro de auto-ajuda...finja não ouvir quando ela disser que nada material, tem  tanto valor o quanto dizem...

Esses sábios gritam dentro de mim: Adequar mazelas à vida é assunto de acessibilidade!!! Você se importa de como os cegos tem acessos aos ônibus, se todas as raças tem direitos iguais, se a medicina curará as doenças, se o lixo está sendo reciclado...saiba que os que não sorriem e que tem pintado em si as dores, precisam viver e também são belos. Caso você não compreenda o que estou dizendo, talvez seria um dos que não compraria um dos quadros de Van Gogh... Lembrem-se dele toda vez que não respeitarem ou compreenderem “diferenças”, que é algo pertinente não apenas ao âmbito físico, a diferença está na alma. Estaremos perto de sermos  tolerantes, quando enxergarmos que não respeitamos sequer diferenças emocionais, condições intelectuais, nuances psicológicas diferentes dos padrões estipulados...isso é tão estúpido que impede que cada ser humano, utilize suas dores para crescer, e ela é a mais sábia das professoras...A sala de aula em que ela não está, todos sorriem como dementes...

Erikaaaaa...ainda vivemos em uma época em que se acredita que “felicidade” é uma condição e um conceito para conseguir um bom emprego e atingir metas da nossa "sociedade do espetáculo", e se resume "felicidade" como um gráfico de interseção entre os risos que o sujeito dá e sua capacidade de resiliência, é capaz até de existir uma fração para isso. Me pergunto como ser resiliente a um falso amor, a um “não desejo”, meu maldito bendito Dorian não digere essas "verdades", mas aprender a driblá-lo é uma arte necessária para a sobrevivência.

Mas apenas peço, que me deixem a sós com minha inexorável condição interna, só nela, eu e muitos, muitos outros, temos a capacidade de existir, e é ela que nos ajuda a enfrentar o mundo real. Nos breves momentos em que fazemos o Dorian dormir, alimentamos as necessidades do nosso corpo, com a alma de barriga cheia. Nada mais me importa...

domingo, 24 de junho de 2012

Caminhos Opostos





Eu só quero ficar quieta...vai buscar a luz do mundo enquanto eu me embrenho em minha escuridão.


Vai ouvir o grito dos homens e me deixe cá, calada, o único que quero ouvir é o meu silêncio, só ele me dita uma solução.


Fagocite as formas que te deixam esquálido, e não me aborreça por querer comer idéias que engordam meus pensamentos.


Vá por onde queira ir, ou pra onde te determinaram...mas se conforme com minha perdidão, pois se seu caminho é um só, o meu é indeterminado e escolho a cada esquina que dobro, de uma nova dimensão.


Não tente seguir um mapa...não vai me encontrar, me enterro em latifúndios ainda não desbravados.


Larga tua lanterna, que de nada vai te adiantar, pois se aqueles que não enxergam nem com a alma ou com os olhos já tem seus destinos traçados.


Segue se dividindo na sua multidão!Mas me deixa crescer com meus olhos vendados.


Se me avistar, não me jogue uma corda...pois em um determinado momento, tivemos nossos destinos traçados.


Você quis subir para o céu, eu me fundi com o chão, e quaisquer ferramenta, remédio, ou placebo, só vai nos manter na ilusão...

quarta-feira, 20 de junho de 2012

O trem




Indignada e obrigada uma longa viagem, só desce um, de vez em quando em determinada parada. E não volta...

Por isso as janelas dos vagões guardam as marcas das minhas mãos em diversos lugares que passei.

Vagoes envelhecidos, portas emperradas, e eu sentada em uma pequena cabine, que já foi grande, decorada, colorida, cinza e de vários matérias.

Eu fui de repente, independente de minha vontade, para um vagão cheio de sangue...roupas de mulher espalhas pelo chão, escuto o choro de duas crianças...e eu choro junto, por que do lado de fora, debruçada da janela, vi um balanço e sobre ele, um pedaço de mulher, outros pedaços ao seu redor...do céu caiam várias mulheres ruivas, bem vestidas, maquiadas...com ar de alegre doida...ela saiu do vagão...a força...

Quis fugir e entrei em outro...o cheiro era de carne queimada e de novo, roupas rasgadas pelo chão...foi um trabalhador...minha avó surgiu e me falou no ouvido...eu assisti e arranquei minhas roupas, por que eu não pude fazer nada...ele saltou durante o seu trabalho...e também não vai mais voltar.

Outro vagão com cheiro forte de cigarro, mas era alegre, o barulho de uma máquina de escrever tilintava, vestindo uma cadeira, uma camisa do flamengo, ao lado calendários de mulheres nuas...um vidrinho de shampoo, especial para homens, silencioso vagão...tímido mas amoroso. O seu vazio me deixou um vácuo, pois senti falta de uma mão no meu pescoço a me conduzir...um barulho loooonge de um radinho narrando futebol.

Fui jogada de cabeça em outro vagão com chinelos pendurados por todas as paredes, pedaços grossos de músculos estirados pelo chão... instrumentos médicos abandonados pelos cantos, onde um cachorro adoecido, falecia...e eu me ajoelhei e perguntei por que...e várias mãos surgiam pelas janelas, se desfazendo desformes... querendo me puxar, me bater, puxar pelos cabelos...eu queria ficar e limpar a cena...ajudar as mãos, tentei por um bom tempo, mas dali saí de rosto deformado, corpo dolorido e alma enfraquecida.

Eu já estava tão fraca...e fui parar em outro vagão cheio de bonecas, pratinhos de salgados, um delicioso cheiro de alfazema...vários espelhos, vários, me mostrando o que refletir daquela cena e da passageira dessa cabine...dentro dele, eu voava e sorria, criava asas e ouvia hinos...uma máquina de costura...que não me fez falta, pois nada mais me faria falta...a doçura partiu, e eu ali, deitei em posição fetal, sofrendo...faltando um pedaço...

E segue em frente...e em outro vagão tem uma mesa com duas cadeiras, vazias, e sobre a mesa, um tabuleiro de xadrez, ninguém jogando...ao seu lado uma garrafa de Campari amparando alguns Lps...Quince Jones, Ella Fitzgerald...Pink Floyd, Raul e outras misturas...infelizmente um cupim os comeu de fora a fora no mesmo lugar. Um ray-ban sobre uma bandeja ao lado de uma coleção de chaveiros de motel...um com uma bundinha...um com um casal que se mexia...e a sensação de que alguém está ali, mas não está...mas, a rainha se mexe sozinha no tabuleiro.

E segue a viagem...poucos foram coloridos, muitos barulhentos...festivos, bagunçados, entram poucos novos viajantes, mais partiram do que chegaram.
E eu não me dei por conta do caminho, pois eu não estou no comando, sequer me dei por conta do que teria nas bifurcações desviadas, não vi a paisagem...não lembro de quase nada bonito no meio desse caminho, a não ser as poucas estações onde entraram chorinhos estridentes caídos dos céus e colocados em meu colo...

Segue...no início eu sorria demente por que acreditava que não teria fim. Os fantasmas eram apenas minha imaginação, por que os espíritos que me acompanhavam, ainda estavam em seus corpos manifestando e colorindo todas essas cabines, que lembrando agora, já foram sim alegres, musicais...

Mas agora, um pouco cansada da viagem, eu cogito acreditar que a parada final é inevitável...e talvez meu pensamento se dissolva no nada, quando eu passar pela porta, isso não aumenta meu medo...estranho, quando eu não acreditava no fim do trilho eu não via ninguém nesse transporte, apenas a mim e minhas dores...únicas como o meu destino hipoteticamente infinito.

Descrente e cansada, devo até torcer para uma parada final num caos onde tudo se desfaça em gases...apesar disso, percorro voltando por todos os vagões, e vejo diversas, milhares de pessoas que eu não via. Eu olho para cada uma delas e me apiedo, algumas estão também com as duas mãos amparadas na janela...sempre estiveram ali.

Passo por dentro dos seus corpos sinto suas mentes, medos e corações.

Eu não era melhor quando acreditava que havia um senhor condutor, que levava esse trem para uma estrada não tinha fim...pois todas as vozes que partiram, me diziam que eu confiasse nele pois de todos os passageiros ele cuidava. Eu me eximia da responsabilidade de cuidar das cabines, cortinas, mesas e pessoas, eu sequer as via.

Eu preferi não crer mais na existência desse condutor, pois esse homem não permitiria tanta dor em seus vagões...Acho que ele partiu junto com meu pai. E agora estou eu aqui, ciente que todos os caminhos e paradas estão sob o nosso controle...trabalhando em equipe cada um tem o seu papel, responsabilidades com essa viagem.

Se ela termina ou não, não sei...mas se o condutor existir, eu entendo que ele tem mais seres inofensivos para guiar, pois se ele nos presenteou, foi com a capacidade de construir trilhos, caminhos e trens que andam com uma cabine adaptada para escolhermos nossos caminhos.

Não me devore




Cobiçado...não sei se é por que ele come os bichos e vomita homens. Ou por que inspira deuses e expira Titãs.

Olham para o alto, e por vezes para baixo, para o ver passar, tanto as fêmeas perdidas em Tártaro, quanto as que estão penando em Hades ou  as que regozijam nos Campos Elísios.

A alma incompleta das mulheres ignorantes o pedem socorro,  e elas sem compreender seus vazios, gritam apenas pelo seu corpo.

Ele nos seus sonhos quer ser herói. Mas manadas de búfalos ancestrais, o mostram que ele não passa de um homem.

São tantas e tantas mulheres que pairaram evasivas, invadindo esses sonhos, que em um oásis, deixaram durante suas noites de coincidentes insônias, suas "lágrimas pervertidas", para ele se banhar.

Ele se banhou? Talvez...o que sentiu, senão o prazer instantâneo, quem sabe a Culpa é a sua única mulher que ele não enxerga, ou simplesmente o Vazio?

Qual o homem que ao olhar para baixo, em alguma altura de sua vida, não se sentiu armado e ereto por uma enorme torre cinza...na qual ele tenta escrever suas histórias de amor?

E por acaso se escreve histórias de amor em muros secos e cinzentos? E após sentir fugir dos seus dedos a umidade do prazer?

O que estará faltando para essa mulher que procura a morte no seu labirinto...se ele contém seu universo de bibliotecas e igrejas fugidias, seus intelectos e crenças lhes escapando pelos dedos...

Volta Teseu...olha essa "coisa mulher" nos olhos e avalia o seu abandono interno. Nessa sombra em que voluntariamente se colocou, estão seus medos encarnados, em forma de pessoas que você  não consegue olhar de frente.

Alimenta com seus sonhos essa mulher, que te pede livros e deuses...Sim, foi na sombra que você conseguiu criar, mas libertou alguns monstros, dos quais só sua própria Ariadne pode te salvar.

terça-feira, 19 de junho de 2012

Meu espelho






Torvelinhos!!! Que porra é essa...vendavais, interiores! Eu sinto...me basta fechar os olhos.

Por que sinto que os meus sonhos cresceram, por eu ter mais espaço. Sim, eu tenho mais espaço...e nem um cubículo aprisionaria meus pensamentos.

Nem sob tortura eu retorno, por que dentro de mim eu vi o céu...e nele, mesmo no escuro eu me encontro.

Eu já vi...em muitos momentos, ao olhar no espelho, terrenos áridos, plantas murchas, cabelos curtos...mas hoje não. Hoje eu olho, e sei que mesmo se estivesse amarrada e com algemas, não importa, limpei os quintais dos meus submundos. Eles eram vastos.

Mas meus submundos viraram minha varanda. O pátio onde eu me amparo quando me encontro pequena ou chorando. O oásis que eu bebo água, depois que me permiti secar minha boca sem medos, de tanto gritar!

Ninguém diz para eu não  me “per vertere”...eu “me ponho ao lado” de onde meu bicho mandar. E é nesses espaços não permitidos que eu estava escondida, quando acreditava que desejos não existem.

Eles existem e não são monstros alados e muito menos bois da cara preta a me assustar. São apenas cantos do meu jardim de inverno, onde eu deveria ter voado quando a dor a dor insistia em pousar.

Mas meu mundo não tem mais portas ou muros, se comecei a derrubá-lo com dedais que passarinhos me traziam aos poucos, em um dado momento, criei bombas com meus próprios hormônios, que poderiam derrubar até o muro de Berlim, Muralhas da China...uma dose um pouco maior implodiu meus pesadelos.

Nesse espaço arejado, aguardo o surgimento de novas curvas ou esfinges. Com as respostas na ponta da língua, as armas na ponta dos meus dedos lançando versos. Flutuo.

Eu não temo o movimento das ruas, mas por enquanto nelas não encontro a liberdade que a solidão me permite.

Se o medo da solidão já me manteve morta, a coragem de enfrentar essa filha da puta,me permitiu existir. E eu existo! Sem países, cidades, ruas ou casas. Talvez até sem meu corpo, por que me basta fechar os olhos, pra eu entender nunca que nunca estou só , se em minha vida perdi alguns pedaços por aí, eu os encontrei, e no espelho eu me vejo por inteiro.

sábado, 16 de junho de 2012

Eu comigo mesma



E assim eu me sinto hoje: Mais falange do que legião, eureca! No  meu inferno, Hades não me deixa em solidão! Depois de pagar Caronte e enganar Cérbero, me sinto e me vejo da cabeça aos pés, matando todos os “quem me dera”, parindo todo meu proibido e me transformando em uma imensa e monstruosa quimera...

Eu consegui, eu sou a esfinge por mim mesma decifrada! E mesmo assim fiz questão de ser  devorada... pois eu tenho em mim o Édipo que matou o seu pai na estrada, e a árvore que pelos seus pés o pendurou, sou também sua filha que o acompanhou cego, e em Tártaro me deixou...Só estive de passagem pelos Campos Elísios, onde os titãs me mantiveram em hospedagem, em acordos torpes para garantir minha viagem.

Filha das três fúrias: Tisífone, Megera e Alecto, e da medusa: A amante castigada de Poseidon, e semi-deusas e deusas inferiores, que escondidas de Nicéia, vieram parar neste país sincretizado pelo carnaval, e com todos os orixás homens, se regalaram..

E nasci eu! Cobra criada, megera domada, Perséfone encarnada, alma orgulhosamente degenerada! Enfim sós...

Frankstein moça...que tapou tooodos os seus buracos, com matéria da minha mutilação, restos materializados da minha humilhação! Criação! Inteira e irresponsável única, pelas batidas do meu coração.

Dentro de mim, eu sou até o meu homem, animado e me animando, me abraçando pelas costas (encochando), me orientando, voando...todos os meus sentidos e vontade, bolinando, acariciando. Sim, tudo sou eu! Tudo eeeeeeu!!

Sim, redundância...dança pagã e perverso sexo, com meus “eus” desde a infância, no meu interior  minhas matrioskas vibram, e me fazem cócegas para me mostrar quem eu sou!E acho que descobri!

Putz, a mais de dentro grita: Se achou nem fudendo! Terá sempre várias loucas de você partindo, e milhares de deusas novas, nascendo.


quinta-feira, 14 de junho de 2012

A maior das sensações




Dedos e contatos...entrega da nuca como alimento, profundo esquecimento da humanidade. Bicho. E o chão parece agora de pedras e folhas e beira de lagos ou rios. Ventos e chuvas...reproduzir não pela reprodução.

Prazer que traz lembrança da fome, sede, frio saciados...amnésia de toda racionalidade, soterrada pelo único sentir com sentido. Dessa sensação devem ter nascido os vampiros, zumbis e lobisomens, materialização da sensação que não permite racionalizar. 

Descrever um crescente sopro interno¿Ser invadida pelo fogo no inverno, pelo gelo no verão. Ancas como um farto caldeirão.

De certo ele o causador único de todo o caos implantado¿ Pressuposto da multiplicação e da divisão...único motivo para o crescimento da nossa civilização.

Estava na caixa escondida de Pandora, no ápice dos livros intelectuais, misturado ao grão assado na hóstia paroquial, liberdade da semente simples, do reprodutor mais banal, lacre das Marias, perjúrio dos padres, nosso laço animal.

Vendaval! Fugir do corpo nele estando, estar na alma e dela fugindo. Curar ferindo, ferir curando, instrumento rasgando.

São segundos. Se fossem horas não desceríamos das árvores, não pensaríamos, não inventaríamos ferramentas e nem dizimaríamos os mastodontes ou os Neandertais, se fossem horas não quereríamos nada! Nada a mais...

Sensação que o sagrado precisa profanar...talvez por que ela esteja espremida entre a criação e o criador. Ou quem sabe a mais pura intangibilidade... o único impossível descrever, animalidade disfarçada de amor.

Alguns dizem que é essa a sensação da morte...será¿ Isso justificaria corpos rijos e olhos arregalados, rostos empalecidos e bocas arroxeadas. Justificaria até a reencarnação! Vamos então  descer de novo e até provocar a inanição.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Posse?





Eu não passo da terra que brotou meus filhos, e não tenho mãos que os proíba de desenterrar suas raízes.

Essas plantas partem e fazem de suas raízes, pés...e vão enfeitar o mundo.

O buraco que fica nesse lugar, nem cimento tapa, mas a chuva castiga e o sol resseca, mas ali realmente era apenas morada.

Até nossos corpos são emprestados, e um dia para essa mesma mãe, temos que devolver.

Eu fecho os olhos e penso nos meus filhos...

E acho que ser mãe, aliás, tenho certeza...prova a existência de um plano...

...eu não sei quem fez esse plano, pode ser apenas a natureza a detentora destes labirintos da vida...
mas...lágrimas...

Aprender dessa forma, é como aprender que realmente não nos pertence nem a ponta do fio de cabelo, até os pés...

Pois se uma parte de sua carne, se descola e continua...e não pode haver ligação no mundo maior que essa, como se alegrar com ser dono das coisas?

Se nem o que você gera com amor lhe pertence, o que nos pertencerá então?

Nada, absolutamente nada, então...por que viver em função de ilusões com forma, peso e valor?

Eles estão vivos...existem, eu quem criei e seguem seus caminhos.

Vou eu sofrer por não ter uma casa? Um carro? Uma meta material não alcançada...mas por Deus, eu adoraria sorrir por ter essas posses, ou chorar por não tê-las.

Mas não posso, não consigo, essas coisas não merecem minha dor ou minha alma. 

Tinha a pretensão que o que gerou é seu? Não, nada é seu. 

E só cuidas das coisas que lhe confere esse sentimento de posse? Essas coisas estão te enganando...ou você se engana ao tentar acarinhar naturezas mortas? 

As naturezas mortas seque existem, pois existir é um estado plural, o que existe é o que te conpensa o carinho doado, é o que te responde com o olhar...

Esses seres, que retribuem, retribuem e são livres na medida do possível.

Se cada um já tem que cuidar e zelar pelo seu próprio corpo e espírito, e é para isso que estamos aqui...tomar para si essa responsabilidade é sinal de egoísmo e posse, é anular a existência do outro.

Pois ela, a existência, é para que aprendamos a ser jardineiros.

Jardineiros da própria alma, o vaso...o vaso também é um intrumento...

Quem idealizou tantos jardins, não sei, mas desacredito que tenha sido um homem.

Pois se redondas como o planeta ficamos, nutrimos como a terra, abraçamos como as árvores...não acredito que aquele que só entrega a semente, entenda completamente o que é a vida.

Ele pode entender um pouco.Mas só que grunhiu como a natureza, quando acreditava que somos apenas racionais, tem o poder de compreender a criação.

Só quem expele seu mundo, vivencia o verdadeiro big bang. Só isso que nos ensina que possuir é uma grande ilusão.

Amar é olhar as estrelas, distantes, cegas, surdas e mudas... e torcer por elas mesmo assim. 

O nascimento é para aprendermos a apenas contemplar o universo, sem ter a estúpida crença de dominar.

Pra que então existir? Fazemos parte de uma grande obra, uma pintura de diversas nuances, sentidos e faces.

Somos apenas elementos que compõe um cenário de perfeição, nos basta sentar, e olhar em todas as direções, chorando, rindo...agradecendo. Agradecendo a experiência de fazer parte de uma composição tão perfeita...nos foi permitido conviver com esse cenário indecifrável.

Paremos de tentar possuir, dissecar, decifrar...

Olhem para todos os lados e apenas sintam que somos o único milagre que existe, em meio a tantos seres desprotegidos e sem palavras, o acaso fez de nós fez os únicos a pensar. 

E será que foi o acaso? Somos únicos que podem testemunhar a beleza, registrar as histórias da criação, e transformar ela em sonhos.

Não percamos nosso tempo demarcando territórios, ele é infinito...

Palavra e Significado




Conheço “Pessoas significado”, são seres que pouco estudaram e por isso, o léxico é pequeno mas semântica é vasta, talvez como o universo. Admiro aqueles que falam com brilho, sem ter sequer visto estrelas. Inventores, gênios, que com pedacinhos de cacos constroem castelos se vidro.

Eu tenho uma grande amiga do morro, que pouco estudou e seu castelo está quase atingindo os céus... ali tem vidros que rasgaram seus irmãos, machucaram seus pais, abriram seu ventre dando luz a novas estrelas...ela nunca ouviu falar em Gaudí, mas assim enxergo sob sua iluminada cabeça, as suas construções de cacos.

Os palavrões que ela profere são santos que eu respeito. A combinação de seu não grande vocabulário, apesar de por vezes desordenado, por vezes “disconcordantes” verbais ou nominais, me mostam a sutil diferença entre inteligência, cultura e sensibilidade. Ela tem os três, pois se a cultura dela diverge da minha, isso não desqualifica a sua existência... ela profere tranças da favela, com fios que vieram da África, passaram pela senzala, dormiram no quarto do senhor do engenho, apanharam do capitão do mato.

Infelizmente, conheço “Pessoas palavra”, pobres Teseus perdidos em labirintos de palavras de grafia correta. Fios de Ariadne embolados em nós sem significados. Estudiosos orgulhosos de suas togas e pensamentos da ninfa Eco. Narcisos afogados. Prometeus acorrentados. Fofoletes! Em suas caixinhas de fósforo. Habitantes souvenires do universo.

Falantes, ouvintes e observadores cegos, surdos e mudos. Criadores dominadores do termo “analfabeto”, pois eles dominam o alfabeto, e o ninando em seu colo em berço esplêndido, essas “pessoas palavra” sorriem para seus egos robóticos e alienados, se apiedando das “Pessoas Significado”, pois nesses, as palavras não adormecem estáticas e perfeitas no seu colo, mas dançam na teoria do caos em elementos imperfeitos, mas que geram a terra, a água, o fogo e o ar...

domingo, 10 de junho de 2012

Tempo e Imaginação






Se o tempo, esse filho da puta, é tão cretino e afobado, está aí nossa imaginação para nos salvar.

Ela, a imaginação, não só é a nossa máquina do tempo, mas também é a artista que enche de flores as lembranças embaçadas. É a fotografia que não se desgasta e ainda cresce...

Será que eles são casados¿ O tempo e a imaginação¿ O casamento perfeito ao qual os cônjuges cada vez mais se distanciam, e mesmo assim, um precisa do outro.

Acho que o tempo é o pai e a imaginação a mãe.

Ele marca nossas horas de ir e voltar, estabelece os limites e mostra a dor e as verdades, a imaginação te manda fechar os olhos, e te ajuda a conceber um passado infinito, um futuro cabuloso, malandro.

O tempo te faz o Dédalo astuto inventor te empurrando à a entrada do labirinto, a imaginação é seu filho parido: Ícaro, que voa sem se importar com o derretimento das asas, ele faz da saída deste labirinto, o caminho para o céu.
As vezes Dédalo chega com seu tempo e me faz sentir a vida como um enorme labirinto de dores e erros...deito e chega o Ícaro, a idéia que é mais viva que quaisquer formas que eu conviva na luz do dia. Ícaro voa, e com ele e a imaginação eu vejo tuuuudo pelo alto e a beleza que o tempo não me permitiria contemplar, ele me mostra, me abraçando e sussurrando que é através dessas imagens, montanhas e frios na barriga, que a vida tem sentido tangível.

Pois são só nossas idéias e sonhos, que são de fato real.

Eu acredito nisso sinceramente: estamos vivos é no momento que dormimos, acordamos mortos e aprisionados por uma matéria limitada, correntes da alma...carcereiras que não nos permitem voltar para onde o universo é nossa criação.

Não, meu mundo não é esse que passo por ele sempre desapercebida, em função da pressão dessa porra de carrasco tempo, que não me deixou sequer parar para observar que a cada dia perdemos com nossos filhos em sua forma mais inocente, é um pedaço dessa inocência que estamos deixando de contemplar...Só a imaginação me leva a eles, e a outras peças desse tabuleiro da vida cujas peças inexoravelmente, se dissipam.

O tempo produz uma pressão qual fosse o marido que tem pressa de sair. Ele, o tempo pode ter pressa, não há problema nisso, dou ele sarcasticamente de oferenda: meu corpo...

Tempo estúpido que crê me dominar, sem se dar conta que ele não existe na imaginação ou na alma!
A imaginação esconde as asas que me deu, e no breu da noite ela me devolve.

E vestida dela eu voô sobre as coisas que não conquistei, as que vivi, e ao olhar pra frente, ela me mostra uma casa com milhares de portas, pois de mãos dadas com meus sonhos vou escolher a porta certa.

O pobre tempo será um eterno perdedor, ele se sente seguro por ser o dono dos meus bagaços, ignora o fato de que a imaginação guarda escondida o suco deste bagaço, o sumo que alimenta minha eternidade, e me mostra que posso caminhar com calma, com a velocidade de quem sabe que esse pai relativo tempo, é banido de nossa alma.

Esse tempo é digno de pena...e se considera o controlador de todas as coisas, coisas que justamente por cumprir suas regras, partem para meus pensamentos, e o deixam na mais completa solidão. Por isso aqui dentro, ele é só o vácuo do meu universo em expansão.

Pintura despreocupada





Crescendo, não envelhecendo, é como me sinto através dos meus cabelos mais longos, minhas ancas mais largas, seios sem leite porém mais redondos. Minha pele é mais grossa para conter minha alma fortalecida. 

Não temo perder a feminilidade, o que é da minha alma de mim não se separa. Minhas palavras são cada vez mais convincentes e sedutoras, e se em volta dos meus olhos começam a surgir sulcos, é para receber os rios de vida que nos meus olhos não mais cabem.

Não penso em juventude e não temo a velhice, as palavras que em mim rebolam já foram duras e sem cintura, meu apaixonar caminha de saltos altos. Minhas curvas podem estar menos tênues, mas é por essa estrada que minha alegria caminha com segurança.

Me sinto grande, posso ver tudo de cima, mas posso estar perto dos seus olhos, ou te louvando de joelhos se você for poeta.

Estou é nascendo, e não vou acreditar no contrário por que meu corpo está cansando. Meus sentidos são mais aguçados, minhas alegrias mais louváveis, meu choro mais passageiro...

Sim, eu já me senti muito, muito feia, mesmo jovem, não me sinto mais, por que minha tela não está vazia, nela está impressa os meus caminhos, conquistas e dores. Pinceladas marcadas de Van Gogh são mais expressivas do que Rembrandts com suas lisas veladuras. Me sinto no “o grito” do Munch, no “Campo de trigos com corvos” do Vincent, na mulher escancarada de Schiele, e a tinta derramada em gotas vermelhas de Pollock.

Eu quero minha adolescência pouco dançada!






Suplico pela lembrança das caronas para Itacoatiara e suas tardes onde a alienação se apiedava do meu futuro...

Fecho os olhos e palavras não me vem, só rodopios e cabelos esvoaçantes, ombros estáticos sobre ancas frenéticas. Suor! Descalça....O cabeço suado colado no rosto...roupa grudada em nada incomodando.

Desvario despreocupado com as horas, olhares não intelectuais falando com minha boca.

Corpos! Que gritam o que minhas palavras calam.

Desengonçada ou provocadora, viva...Replicante do meu sangue dos vários continentes me batendo, batendo por dentro como sendo eu o próprio tambor.

Tchau, sua besta intelectual, vá embora e deixa a outra ficar, aquela que calculava mentiras bobas e se ria delas. Que acordava vibrando quando a sol passava sob a fresta da cortina, e nada era preciso além de qualquer biquíni e um trocado para a coca-cola e o hambúrguer...a carona chegava...

A cortininha que não escondia quase nada que realmente não queria estar escondido. A alegria pura. O sal ressecando os cabelos longos, emoldurando a face tão morena, de pastas brancas protegendo como pintura de índia...

Para onde eu fui!! Deixei minha alma na praia¿Há multiverso que me ajude a voltar¿ Não...mas quem sabe muitos versos...me ajudem a quebrar tudo. Salgar o cabelo¿ Manchar o baton, subir a saia¿

Gritar e rodopiar ao vento.

Basta fechar os olhos e rodar, rodar, rodar...Erikaaaaaa, eu quero voltaaaaar!!!

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Casa




Em casa que se entra de mãos vazias, se sai de mãos vazias. Eu entrei de mãos vazias, cabeça aberta, ouvido seletivo e boca apaixonada.

O meu usufruto das coisas que aqui estão não configura minha posse sobre nada.

Eu vou e minha casa fica, meus livros e filmes, meu cabelo ao qual tanto me preocupa a sua beleza, também fica, sobre os vermes. Até meus filhos ficam...

Nunca darei a eles, meus filhos, coisas que nunca me importei em ter. Pois toda vez que eu olho para as coisas, as mais simples coisas produzidas, o que me vem em mente é todo o seu processo de produção: Tanto as vidas que proporcionaram a produção dessa “Ilusão”, quanto aqueles que acreditam que a apreensão dessas “coisas” os fará mais feliz.

Penso também que essas vidas que criam “produtos”, o fazem pelo dinheiro que comprará novas produtos...que são produzidos por outras vidas, que também criam outros produtos, que será consumido por outras vidas...

Eu já tive a crença de que vários períodos já foram mais interessantes do que os nossos, em função dos valores de glamour que estes possuíam. Mas meu fascínio tem retrocedido, a um tempo onde glamour não existia. Nesse lugar a casa era mais enfeitada, e os bens dessa terra não submetiam ninguém a fazer parte de uma pirâmide de produção. 

A natureza sempre foi o mais democrático de todos os sistemas, essa fábrica sem operários é a melhor comparação que existe entre os filhos e a mãe: Quanto o mais cuidarmos o seu leite, mais leite ela vai produzir, em troca nos bastaria que não feríssemos seu corpo, o que não foi possível para nós, operários acostumados a apenas esperar o pagamento e depredar seu ambiente.

Mas essa casa é sagrada, não apenas pelo que ela produz, mas pelo fato dela ser um enorme lar, que aconchega milhares de visitantes mal educados.

De tudo que eu posso vir a deixar para meus filhos, apenas as boas ideias terão vida perpétua. Você pode se programar para deixar suas idéias para os seus netos ou bisnetos, não há inventário para divisão de bens que se multiplicam.

Eu parto com mais idéias do que quando cheguei, deixo as mentiras que meu ouvido ignoroue com os carinhos que minha boca apaixonada conquistou.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Elementos


Eu sempre me perdi entre todos os elementos, e quando eu era para ser calmaria eu fui vento...de tantos mares, tantas águas que eram para ser regulares como os rios, fui tsunamis...e fiz parte deles nos meus sonhos, sendo tragada, tragada...e para me salvar fui subindo, subindo nas ondas...tanto, que o descer poderia ser fatal.

O fogo sempre me salvou, chegando em lentos relâmpagos em advertência para as tempestades que chegariam, ele não me trouxe a paz mas me acendeu sempre a luz, a antecipada luz que permitia, nos momentos em que a onda estava láaaaa em cimaaaaaa, olhar tudo com clareza...a clareza do ar que me traga desse maremoto imaginário, e me permite sobre ele pairar, e ver tudo de cima...o ar me contou que das vezes que ele foi vendaval, foram minhas emoções que o fizeram, ele agora calmo, me aconselha a fazer uma amizade com a terra, a fugidia terra...o ar repetiu o sussurro da terra: Erika...você vai conseguir ficar aqui se fizer as pazes com o mar...

De nada me resta senão me queimar no fogo...se eu não conseguir apaziguar meu pensamento, minha razão e meu mar emoção...que são imensas e confusas dentro de mim...

Esse fogo intuitivo que sempre me falou e eu muitas vezes não ouvi, ele me faz sentir com um simples arrepio, que eu não tenho saída. Nada me resta senão o aprender a trafegar...a navegar, caminhar, voar....

Quem não navega em paz é tragado. Pelas suas oposições, pelo seu desequilíbrio, pelas enormes forças que você possui, mas a transforma em demônios... sendo elas o seu único anjo... seu único condutor.

Olhe para dentro. Sinta a sua força e escute seus sonhos, neles estão o que você se recusa a ouvir, e o que você precisa para crescer.

Não, não evite terremotos, maremotos, tsunamis, vendavais, grandes fogueiras, pois são elas que te trazem a intensidade da vida...mas deixe essas naturezas fazerem as pazes, para que você não se aproxime de um momento em que só uma dessas forças te trague, use-as para te salvar...para te ajudar a circular, a ir...e a voltar...

Mas nunca se conforme em estar parado, nem sob a terra, boiando sob o mar... sufocado pela falta de ar ou sem o fogo de suas intuições.

Está dentro de você, e não fora, as armas para suas revoluções...ouça...

domingo, 3 de junho de 2012

Só as palavras criam um universo





Chega um momento, em que só te resta ser, aquilo que você fala.

Todas as coisas que você tentou possuir, conseguindo ou não, ficou claro que não é seu, e que nada, absolutamente nada tem comprovada eternidade.

Seus valores são tão particulares, que não estão em todos os lugares do tempo e do espaço, então, você acha que eles, ou não eram para existir, ou que não tem devido valor, visto que não correspondem "a maioria", pena...essa poderia ser a coisa que faria com que as pessoas te olhassem com estranheza.

Ignorantes que somos, interpretamos "o olhar de estranheza", como a espada que aponta nossas diferenças ou loucuras, ao invés de enxergarmos nestes olhos,  a luz  de quem fita a verdade, ou o excepcional pela primeira vez.

Há uma parte sua, que existia quando você nasceu, e que foi morrendo enquanto você acreditava viver. É a parte que te ajudaria a aprender que precisamos desaprender para pensar, que precisamos fazer parte não fazendo, que nenhuma escolha é compulsória.

Só a palavra que é exclusivamente sua reverbera, mesmo quando ninguém a ouve, pois só ela declara a legitimidade da sua existência. Esteja você no meio de um deserto gritando  ou pensando, ou seja ela declamada a uma multidão...sua palavra digna não ouvida e seu pensamento, pode construir mais que suas mentiras públicas, essas não são novidade pra ninguém. A sensação de aceitação que você tem ao gritar a palavra alheia, é semelhante ao que o macaco sente, ao ser aceito em um grupo.

Nada vai suplantar o final que já conhecemos, é por esse final mórbido que você crê que só te basta sugar a vida até a última gota¿ Sinto muito, você é pequeno e por isso está vivo. Sente-se e aguarde essa enorme baleia morte chegar, de preferência com um atiçador para ela vir mais rápido... Sua outra opção é sair do cais, e fazer a diferença enquanto ela não chega.

Saia desse cais e perceba que no deserto, na folha em branco, pode repousar a crença em si mesmo, a que ninguém te ensinou, que surgiu do seu próprio nada...as suas notas musicais rompendo o silêncio, isso te parece pequeno¿

Justo, essa minoria é você. Retirando todas as idéias dos outros, essa fagulha aparentemente sem significado, essa coisa aparentemente pequena, era o que seria seu diferencial, é o que seria você, é a sua simples oportunidade de criar seu universo particular... uma força mais ou menos assim, com poucos elementos, criou o universo em expansão, mas o homem não gosta de começar por baixo, não é mesmo¿



A vadia virgem.



Descobri que nascemos mortos em caminho à "Vida", e ela é uma uma mulher, sim: Eterna mulher desconhecida....essa mulher que nasce muito, muito velha e esquecida, e vai rejuvenescendo com o passar dos anos.

Na flor da idade, a Vida dá pra todos, se manifesta com vigor, abre suas pernas e se deixa usar.... Dorme com todos no meio de seu caminho, mas ela parte criança, cobrando pelos seus serviços em moedas sejam de ouro ou prata.

Ela que veio velha e já foi cheirosa e curvilínea, parte como uma criança... Provedora e castradora. Linda ameaçadora...Pois é...percamos o medo desta puta inocente enquanto ela ainda está com disposição. Gozemos enquanto sua companhia for inevitável...em agradecimento ela me solta bem aos poucos ao vento...quão mais sou livre, menos preciso do seu  suprimento...nesse momento ela sussura:  "Quanto mais   se aproxima da morte, mais se apieda do nascimento..."

Quando escrevo ela me dá um tambor, e me diz: Toque igual as batidas do seu coração, e perceba que estou ao seu lado neste lugar onde todos os meus filhos foram misturados...então ela samba por entre minhas letras, sai do mar como Iemanja e mergulha como Poseidon, se embrenha na terra como Gaia... gera filhos como Ísis...rebola como as semi-Deusas que aqui brotaram.

No caminho reverso da estrada, nesses três quartos do caminho, ela me fez virgem. Tanto com esta mulher caminhei, passei ao seu lado por tantas, mas tantas bifurcações, que ao olhar para trás, quanto mais o tempo passa, tudo é confuso, tudo é imenso...menos eu sei...e olhando pra frente eu sou Virgem! E tudo que me penetra, é a primeira vez que me invade.

Essa sábia ordinária me aponta que são tantos que eram para ser e não foram, tão poucos que não eram e estão... e todas, e todas aquelas crenças que tínhamos sobre ela... se afogaram nos tsunamis invisíveis do passado deixando poucas lembranças...e as que ficaram, nossa, e as que ficaram ela estava ainda em meia idade, ao meu lado no primeiro choro dos meus filhos, no beijo final do meu pai e o  primeiro banho do meu neto...sorrindo e batendo palmas.

Frente a frente a mim, ela sorri, quando a conto que a  paixão já foi tão mais dolorida, o choro apesar de mais intenso, completamente infundado... e que apesar da ignorância proporcionar mais possibilidades de surpresa...tudo já foi tão mais complicado...

O amor... sobre o amor ela me chama de pretensiosa, pois nem ela o detém visto que só querem o seu corpo...o amor então, aquele que um dia acreditei estar em minhas mãos, aprisionado...não cabe em mim e por isso não me pertence como a terra não é dos índios mas por eles foi cuidada... são todos filhos dela, a tal da Vida Vadia Virgem...que pari e solta no mundo. A cretina diz crer que essa abandono é o maior ensinamento aos seus filhos...e por isso passamos anos tentando desvendar quem é o nosso pai...mas como saber se ela dormiu com o sol, com o mar, a terra e todos os gases do Universo....

Com ela ao meu lado, quanto mais me visto para encobrir os nós do meu tronco, mais minhas folhas sobem, mas os frutos são doces, pois no caminho reverso da estrada, meu corpo é o pobre santo velho que suporta minha jovem alma vadia, como esta puta virgem que estou ao seu coloamante sábia que de noite esconde o corpo, criança ingênua vestida de dia...

sexta-feira, 1 de junho de 2012

Crônica da moça perdida



Em casa, as crianças aprendem que o sucesso são as marcas, aprendem que existem carreiras em alta! Que eles precisam sobreviver. Aprendem que: Arte menino!! Isso é coisa de bicha! E é banal! Isso não tem propósito no nosso tempo meu filho! A arte já atingiu limites sua boba! Da Vinci foi um gênio que não existe mais! Van Gogh morreu louco! Cazuza morreu de AIDS! Elis de overdose! Morrer?? Pra que?

Eu. Sou louca (sinônimo de pensamento livre). Se dentro dos meus conceitos de eternidade, me perguntassem antes de vir: Erika, você vai lá embaixo, você vai voltar no tempo e vai renascer na alma de Van Gogh, você não vai ter o poder de mudar nada que ele fez, você vai ter só que sentir, viver, sofrer e morrer como ele...você quer descer? Eu desceria! Eu pintaria seus quadros, eu cortaria sua (minha) orelha, e morreria louco. Mas eu viveria essa experiência.

Eu acho que estudei pouco. Não li grandes filósofos. Do pouco que ouço de alguns, me encontro modestamente em alguns raciocínios. E a minha resposta bem simples para essa identidade é: Sempre pensei muito. Estou errada. Não quero ser ignorante. Não me justifico por minhas mazelas. Sei que das “vezes que cheguei atrasada”, eu simplesmente cheguei atrasada por motivos que não eram para me servir de desculpa: Eu sei os caminhos, eu sei que o rush existe, eu conheço como ninguém as eventualidades. Mas muitas vezes eu não cheguei. Muitas, muitas vezes mesmo, eu desisti antes de chegar, muitas vezes eu cheguei e vi que não era aquilo que eu queria  ou saí de fininho, ou saí correndo, ou me desesperei. Mas eu quero me perdoar, nunca me justificar. Entendo agora, que todas as minhas perdas, principalmente as materiais, ou todos os caminhos que não cheguei ao fim, são fruto da minha total incapacidade de transitar de minha razão para minha emoção. Eu sei, que todos os dois lados, são muito fortes em mim, mas eles não conseguem conversar, eles não sabem negociar.

Quando me lembro de minha infância, me lembro de uma criança que ia excepcionalmente bem a todas as disciplinas escolares. Estudei nas melhores escolas e tive pais que me ensinaram o que é liberdade de uma forma que pude avaliar todos os ônus e todos os bônus que essa liberdade me concebeu. E eu mesma não sei dizer em que ponto em que minha razão e minha sensibilidade começaram a brigar. Tudo que sei, é que tive diversos motivos sim, durante a passagem da adolescência para minha vida adulta, em que os acontecimentos eram tão intensos, tragédias na acepção mais comum da palavra, ocorreram e os diversos caminhos que eu tinha com relação as minhas vocações, se multiplicaram em milhares de dúvidas que, se por momentos, minha razão tentava me orientar para um desses milhares onde eu poderia ganhar dinheiro, ser doutora, matemática ou outra coisa qualquer com grande conhecimento, minha emoção começava a gritar para escrever, para pintar, para não me preocupar com a matéria, para eu dizer um foda-se para o sucesso...e eu dizia. Não sei ainda por que. Não sei ainda como consertar esse diálogo.

Sei que tem momentos que eu poderia dizer até que sinto fisicamente essa briga interna. Sinto essa força. Sei que ela é grande e sei que ela pode fazer de mim uma louca ou alguém com uma sanidade diferenciada. Sei de certa forma traçar meus pontos fortes e fracos. Sou inteligente. Raciocino acima do normal. Consigo bloquear interferências, isso pode ser bom, por que minhas noções de justiça são limpas, difícil contaminar minhas idéias, fácil melhorá-las, mas difícil contaminá-las no sentido de que sempre tentei refletir onde está o pensamento da massa e sei onde está o meu. O que eu achava ser meu ponto forte, sei que é minha fraqueza: Não sei fingir. E quando busquei meus conceitos de “fingimento”, talvez eu tenha sido sim contaminada. Mas o fato, é que se já precariamente entendi o que são as máscaras que vão me possibilitar a EXIBIR só o que eu quiser de mim, eu tenho quase certeza, é que tudo que está aqui dentro brigando, é bem diferente do que podem esperar de mim, e muitas dessas máscaras sociais que eu deveria aprender a incorporar, talvez em mim inexistam...

Be on the surface




Brinquemos sempre na beira do mar, onde todos estão e compartilham das mesmas realidades... Quando eu tinha 6 anos, eu me afoguei, vi um raio de uma latinha e fui atrás dela, só me lembro da visão do sol por debaixo d’água, quando a onda vinha e me levava mais para baixo, e do medo estúpido de um tubarão comer meu pé...obviamente, como estou aqui lhes escrevendo: fui salva, mas, isso é verdade e julguem como quiserem: passei alguns meses, que todas as vezes que eu entrava no banho, eu ouvia gritos e vozes, não quero explicar isso, pois eu mesma ainda não cheguei a uma conclusão, e minhas suspeitas estão longe de serem reais.

Mas, no decorrer da minha vida, me dispus a fazer alguns outros mergulhos, esses sim em minha alma, que confesso: não sei se consigo me encarar. Pois, com certeza vos digo: o quão mais profundo é o mergulho na tentativa do auto-conhecimento, mais difícil é retornar para a realidade.

Para conviver, é triste, mas deixamos de existir...e todas as regras que nos introjetam desde a infância, fazem com que nossa existência deixe transparecer apenas o dedo mindinho de quem realmente somos.

Sim, fique na superfície, só ele te protege de você mesmo. Olhar a lagoa do lado raso é sempre mais seguro, nela você reconhece tudo que está a sua volta.

Não, nunca mergulhe em sua alma, ela foi feita e está escondida nas suas próprias profundezas, justamente por que você não tem o poder de sustentá-la, ou quem sabe suportá-la.