domingo, 26 de agosto de 2012

Per Vertere 1




O moralismo é uma pedra bruta que envolve o ser humano, é um gesso que imobiliza o auto-conhecimento, sendo assim a auto-aceitação.

Somos congelados pelos conceitos de felicidade e moralidade, e a não observância deste fato, faz com que olhemos nossas frustrações como atividades fantasmas, dores inexplicáveis, tédios nonsense, esquizoidias...mas seriam esses, apenas desejos não assumidos? Pior que não assumidos: totalmente desconhecidos.

Tenho refletido sobre o imenso "vazio" que paira no universo das conversas femininas, todas impreterivelmente o declaram, e nunca nos respondemos amoralmente o que preencheria esse lugar...pois certamente se fossem características "normais" que o preenchesse, saberíamos quais são os sentidos, prazeres, desejos que deveriam se apossar desse trono abandonado.

O vazio, a incompletude feminina, nas últimas décadas foi classificada romanticamente como um espaço a ser preenchido por um príncipe, e essa "fragilidade" feminina foi rotulada como "síndrome de Cinderela", as mulheres sendo ainda vistas como bibelôs têm seu tédio explicado pelo lapso de um sapatinho perdido. Alguma vez foi considerado, que o desejo tem como seu objeto sempre um alvo inalcansável? Então tenho me perguntado, o que é o inalcansável para nós, mulheres.

Talvez a resposta ainda esteja trancada em um fundo falso de nossa caixa de Pandora: aquela que vimos se abrir, seus desejos vimos se esvair pelos ares e ignoramos o recôndito da mente humana, aquela que aprisiona e armazena todos os nossos antepassados, desde as mulheres que executavam seus prazeres sem os limites da moralidade.

Não me canso de repetir, que o mal da humanidade até hoje, foi se iludir quanto à sua natureza: Cremos não fazer parte da natureza animal, mas fazemos...somos animais que tiveram o desprazer involutário, de construir labirintos em nossas mentes, labirintos esses, que têm funcionado como uma brincadeira de telefone sem fio, de uma geração para outra. Não acumulamos e aprimoramos apenas o material genético que nos permite prosperar e ser os seres que mais enfrentam adversidades, acumulamos paralelamente a esses dados físicos, dados mentais, históricos comportamentais, que essa reserva sim, é a única que nos deu o poder de construir uma "razão" que nos afastasse de nossas raízes primordiais.

Nos afastamos sim dessas raízes, e olhando pra trás, se nossas ações milenares fossem visíveis, veríamos fios e nós amarrados, embolados no caminho desse labirinto de entrada incerta e saída impossível.

Mas, no momento em que estamos, no hoje, certamente o que preencheria esse vazio, tem relação com nosso início, sempre tem (nisso eu acredito), e eu não digo início da vida de cada indivíduo, digo que nossos desejos, fantasiados, mascarados e fetiches, são encarnações ilustradas dos nossos desejos animais, que impreterivelmente existe em todo ser humano.

Precisamos encarnar esses desejos como criminosos entre quatro paredes até hoje, nesse tempo em que nos consideramos modernos. Nos preocupamos excessivamente com possíveis classificações que possam nos atribuir, sendo assim, a maioria sofre calado como lobo castrado, sem se dar por conta da possível origem desse sofrimento.

Sexo é desejo, e desejo vai muito além do orgasmo, pois se o estopim do orgasmo para maioria das mentes pouco criativas é apenas o toque, e isso sim é nossa herança animal, nossa relação com o desejo e a fantasia são a nossa diferenciação mais pura do mundo animal, porém esse "plus da humanidade" linka cada fantasia com um desejo primitivo, isso é uma questão de pura lógica, o que eu pergunto é: Qual sensação primitiva está ligada à sua fantasia? Pois sim, o plano de fundo do sexo é sempre o primitivo, o físico que nos fez perpetuar a espécie, erupções hormonais, cheiros, ciclos de reprodução...como afirmar que não possuímos esses sentidos com a mesma intensidade que de uma matilha? Pois se assim não fosse, estaríamos procriando em tubos...

O indivíduo não realiza seus desejos primitivos em função da moralidade. Há alguma possibilidade desta afirmação estar incorreta?

Creio que não há, somos literalmente bichos parcialmente castrados. Castrados por idéias das quais não conseguimos nos livrar, pois estão estes, presos em diversos nós de nossos labirintos conscientes, e o pior: Inconscientes".

O inconsciente é o tal que guarda em si todas as nossas gerações, ele é como se fosse um indivíduo à parte de nós mesmos, o mais poderoso de todos, por que carrega nossa história ancestral e trama escondido, a mercê de nossa vontade.. 

Na oposição da realização de nossos desejos, está esse inconsciente, poluído tanto da moralidade que acumulamos, quanto carregado de nossas forças primais, e está também o consciente: alimentados a séculos por esses "nós", já nascemos trazendo para mundo esse emaranhado de regras dúbias e sem sentido. Essa confusão moral X animal é o que cria nosso nosso diálogo com o mundo, como se estivéssemos presos num interminável paradoxo, acorrentados pela armadilhas de nossas idéias impregnadas.

Tão impregnadas são essas idéias, que não conseguimos concebê-las como irreais, pois tudo que nos separa da natureza animal, são construções non sense, são cultura acumulada, são ciclos viciosos de infelicidade... são literalmente nós criados pelo que acreditamos até hoje ser o nosso trunfo: O pensamento. 

O pensamento foi o culpado pela criação de nossas gaiolas morais, ele gerou o ato de deliberar se comeremos ou não comeremos a maçã, essa simbologia "de comer o fruto" nitidamente está interligada há um momento em que a humanidade teve a capacidade de OPTAR pela realização do desejo, quando na verdade, antes disso, não nos era estabelecida nenhuma condição: Ele era executado.

Hoje nos dividimos em seres que repelem essa maçã, e seres que querem devorá-la de forma voraz, nesse segundo caso essa condição está ligada àqueles que querem vivenciar sua natureza animal, pois é moralmente proibido se comportar com a mesma intensidade que a natureza...

Renegamos nossa primitividade por nos considerarmos seres de natureza diferenciada, oposta e superior à dos outros seres viventes que aqui estão, não podemos fazer sexo como eles fazem, para nossos códigos criados isso seria nos igualar aos "coadjuvantes" deste planeta, convivemos com a crença errônea de que somos superiores, privilegiados e donos deste mundo.

Então ser perverso, que vem do per vertere, que significa "por-se de lado", é um por-se de lado aos engendros, invenções da humanidade, armadilhas morais, conceitos religiosos e todas as tralhas e encrencas que engolimos dentro da racionalidade e de nossa crença de soberania.

Nenhum comentário: